Viver
Palavra de Honra | O futuro passa por serem todos uma espécie de fénix depenada
Sal Nunkachov, fotógrafo e editor
- Já não há paciência... para demagogias e inacção, para treinadores de bancada e especialistas das redes sociais, toda a gente com as soluções na ponta da língua e as mãos nos bolsos. para pessoas que confundem o umbigo com o universo e que condicionam os outros, dispondo deles e usando-os como alavanca para as suas agendas egoemburrecidas.
- Detesto... o facto de termos de verificar os verificadores de factos, de sermos tratados como se fossemos indistinguíveis e ao mesmo tempo de haver uma afirmação pessoal que se anula na una voz da multidão aos berros em busca de um protagonismo. o especial dilui-se no marulhar de vozes, e não serve de nada gritar se está tudo aos berros.
- A ideia... tem sido esquecida. a ideia chave, como conceito, como gérmino de feitura, como algo que frutifica e cresce, em regando, tem sido devotado a uma opção de segunda ou terceira, em detrimento dum programa pré desenhado para que tudo brilhe numa reminiscência pop de bola de espelho de vácuos vários, um fogo fátuo ideológico que, seguramente, não é nem pode ser ideal.
- Questiono-me se... não seria mais benéfico as estruturas base terem como missão fundamental ampliar o espectro do pensar e fazer, ao invés de nos especializar em bacharéis que só nos permitem ingressar num mestrado de nada, para exercer nesse mesmo ramo. a escola funcionar oposta a uma prisão e a responsabilidade cívica estar em todos e imputada aos autarcas que gerem as urbes e a toda a polis que a compõe.
- Adoro... a dialéctica, tantas vezes maltratada pelo empolar do ego. observar, durante uma conversa, a linguagem quase materializar no ar. desconstruir cirurgicamente as frases até restarem apenas palavras e repetir até delas restar apenas letras, quebrando a bagagem da narrativa, depois da semântica, e por fim da significação. e olhar os cacos do que foi, tentando perceber o que podem ser.
- Lembro-me tantas vezes... quantas o esqueço, para que a memória seja assim uma espécie de pulmão que infla e esvazia, permitindo o exercício da memória, que ao ficar ginasticada possa relembrar-nos quem somos quando é preciso e olvidarmos quando preciso for. lembro-me tantas vezes como tantas vozes, é este o diálogo com a fotografia viva que somos.
- Desejo secretamente... fazer um referendo comigo mesmo, não alcançando nenhuma decisão enquanto não houver um bem comum, com ou sem ajuda do público.
- Tenho saudades... de poder jantar em companhia de amigos e lançar clichés tão pouco iluminados como este.
- O medo que tive... a semana passada foi injustificado, era só uma ligeira intoxicação alimentar
- Sinto vergonha alheia... da forma desordeira que os automóveis ocupam as cidades. sendo que me mexo por próprios meios, também eu sou auto móvel.
- O futuro... não é risonho. afiguram-se aliás tempos muito complexos, visto que os últimos tempos foram de despreocupação e desconsideração máxima. a classe artística que tem servido as pessoas neste confinamento são as mesmas pessoas que são maltratadas inclusivé pela própria classe. o futuro passa por serem todos uma espécie de fénix depenada. havemos de ver desses voos e migrações.
- Se eu encontrar... juro que vou devolver. aliás, é essa a premissa da pesquisa, poder depois partilhar. daí ser tão importante esta dança dessincronizada em busca do tempo perdido.
- Prometo... não descurar a hipocrisia como crime capital e afirmar que a verdade, ainda que em doses moderadas, faz avançar. em doses mais generosas, faz evoluir, que é uma maneira especial de avançar.
não - Tenho orgulho...