Sociedade
José Manuel Marques: “O Louriçal é uma terra bem trabalhada e bem cuidada”
O presidente da Junta de Freguesia do Louriçal, descreve as potencialidades de uma freguesia histórica que criou um presente orgulhoso do passado
A cada esquina, no Louriçal, vive-se história e tradição. A preservação do património é uma aposta da Junta de Freguesia?
Numa época marcada pelo despovoamento dos territórios, o Louriçal é uma terra onde se encontra emprego, saúde e ensino condições necessárias para se fixar pessoas. A vila chegou a ser sede de concelho, mas perdeu o estatuto e deixou até de ser vila, tendo voltado a ser elevada há 26 anos. Em tempos remotos, o Louriçal marcou a história, teve tempos de pujança e, como outros locais sofreu o impacto de episódios mais negativos da história, como as Invasões Francesas. Nos anos 50 e 60, os monumentos da vila estavam com um aspecto de abandono. Nasci nos anos 60 e, nesse tempo, havia abandono. Foram precisas, pelo menos, quatro décadas para conseguir chegar ao actual estado de edificação renovada. Hoje, o património histórico construído do Louriçal está recuperado. Temos ainda de ter em conta que a presença do convento das Clarissas é uma vertente muito importante e valiosa. Elas mantêm uma dinâmica que é apelativa ao turismo religioso. Estou convencido que, não fossem estes anos de pandemia, as operadoras turísticas teriam feito com que a vila se tornasse num destino desta vertente turística. Agora, estamos a ir nesse caminho e a beatificação da madre Maria do Lado, cujo processo está a ser apreciado no Vaticano por uma comissão científica vai ajudar. Está a ser desenvolvido um excelente trabalho das irmãs clarissas no que tem que ver com a componente religiosa e com as suas peculiaridades, como as missas diárias e a clausura. Em 2021, foi concluída a obra de recuperação do tecto do convento, que há muito pedíamos. Foi colocada iluminação LED e, hoje, é um motivo de orgulho e de visita, pois é possível mostrar aos visitantes a beleza dos azulejos, que são uma das nossas maiores riquezas.
O espaço é visitável pelo público?
Sim, pode ser visitado por grupos. De manhã, o Museu da Madre Maria do Lado está aberto. É só marcar. Estamos também a tratar do apoio a estas visitas e da pessoa que ficará à frente das duas vertentes. Estamos muito empenhados em captar turismo religioso. Recentemente, fomos a um workshop internacional que aconteceu em Fátima, graças ao município que inscreveu o Louriçal e o convento como destinos deste tipo de turismo. Recentemente, foram concluídas as obras na Capela do Recolhimento, que era o último exemplar de património que ainda não estava recuperado, juntando-se, assim, à Igreja da Misericórdia, ao convento, à igreja paroquial de São Tiago e ao aqueduto também. No entanto, os turismos religioso e convencional não nos chegam. É preciso que a freguesia mantenha e ganhe população. Felizmente, temos conseguido que casais jovens aqui se fixem. Em pouco mais de dois anos, contabilizámos mais de 30 edificações novas, um centro escolar completamente cheio, com seis salas para alunos do primeiro ciclo e três para os do pré-escolar. A escola da Moita do Boi também está cheia, com 52 alunos. Tendo em conta os números nacionais da natalidade, não estamos mal e podemos dizer que os números estão a crescer.
E o emprego na freguesia?
Felizmente, não há desemprego no Louriçal. Não apenas pela indústria que temos.... Temos, por exemplo, a Indutex, que chegou a empregar mais de 300 pessoas e que, hoje, não terá tantas, por falta de mão-de-obra. Temos outras empresas com um número de funcionários semelhante. Temos muito comércio e serviços. Contabilizo 112 espaços de comércio e de serviços. Temos cerca de mil pessoas directamente empregadas aqui na vila. Claro que, depois, há a agricultura, as estufas e a exploração florestal. Nos meses após a tempestade de 2018, foi implementada fibra óptica das três operadoras, o que permite fazer trabalho à distância. Temos uma boa rede viária, com o IC8, a A1 e a A17, e somos bem servidos pela linha do Norte e pela do Oeste, caso ela seja, um dia requalificada. Além do porto de mar da Figueira da Foz. Estamos entre Leiria, Figueira da Foz, Pombal e Coimbra e a meio caminho entre o mar e a serra. Não temos indústria poluidora e quem visita o Louriçal encontra um património renovado e muita natureza.
No que toca à gastronomia, o que se destaca numa terra "temperada por louro e sal"?
Temos o biscoito, a doçaria conventual e não só. O biscoito tem a sua origem no convento das Clarissas, mas, depois, as freiras voltaram-se para a doçaria conventual e acabaram por ser as padarias locais a apostar no biscoito do Louriçal. Desde 2017, quando inaugurámos o monumento ao biscoito, a Junta de Freguesia, com vários parceiros locais, iniciou uma grande promoção com uma campanha de divulgação na comunicação social e hoje o crescimento é notável. Estamos a registar a patente do biscoito. Já iniciámos o processo há algum tempo, mas a pandemia da Covid-19 fê-lo reverter um pouco. O trabalho passa também pela vontade dos padeiros - os parceiros - em colaborar e isso está a ser feito. Tenho de reconhecer que, actualmente, qualquer padaria não tem dificuldade em fabricar mil pacotes por dia e não chega para satisfazer a procura. Queremos chegar às grandes superfícies, mas a capacidade de produção ainda não é suficiente.
E que outros produtos estão a ser alvo de aposta?
Há os doces das Clarissas, cujas compotas de maçã e pêra, entre outros frutos, são afamadas. Elas têm ainda bolinhos de amêndoa e de limão. E têm as “paciências” cujo período de validade é mais curto. Vendem tudo isto numa lojinha que está aberta ao público e até aceitam encomendas. Nos nossos restaurantes, há também menus com a gastronomia própria da região. Mesmo assim, o Louriçal poderia explorar mais a gastronomia do arroz carolino e ponderamos seriamente fazê-lo. Já tivemos um dos maiores descasques de arroz do País, porém, com o tempo, a empresa acabou por encerrar. Temos ainda, a nível gastronómico a leitoa do Louriçal - não é leitão, é leitoa. É uma forma diferente de confeccionar o leitão, grelhado e sem ir ao forno. Há, igualmente, uma forma diferente de o partir e de servir. Temos ainda o carneiro e o arroz que o acompanha. Pode ser cozido em branco ou estufado. Entre as razões para uma visita, temos a grande feira dominical, espalhada pela vila. Pego nas palavras do capitão que veio aqui para inaugurar o monumento aos combatentes e que referiu que temos duas partes muito importantes na história da localidade: o convento e a feira. É uma feira que movimenta pessoas e traz vida. Potencia mesmo a sobrevivência dos restantes pequenos comércios que há na vila. Por fim, não posso esquecer ainda um outro exemplo gastronómico confeccionado pelo rancho por altura da Festa de Nossa Senhora da Boa Morte, que são os pedaços de carne de vaca com... louro! Aquilo tem um sabor extraordinário!
A nível ambiental, uma zona tão rica em água chama muitos visitantes?
Temos lontras, que vivem em zonas dentro da vila. E havia ainda enguias, embora não sejam tão abundantes como há anos, antes de as obras do Mondego, para evitar cheias, serem realizadas. A subida da água trazia muito peixe e muito meixão [larvas de juvenis de enguia] até ao Louriçal. Mas com a criação das comportas, ficaram apenas espécies como o achegã. As comportas dificultam a passagem do meixão e criaram uma barreira física. Além disso, os produtos químicos utilizados na agricultura também penalizavam os animais aquáticos. Contudo, houve uma mudança radical e, hoje, os agricultores usam menos produtos e aplicam outras técnicas. Por exemplo, o lagostim, que era uma espécie a abater, porque destruía os diques, hoje, é capturado para a alimentação e os espanhóis compram muito lagostim nesta zona. Vivemos numa zona paisagisticamente muito rica, onde há espaços de lazer como o parque de merendas da Fonte da Pedra e os arrozais. A tempo da Festa de Nossa Senhora da Boa Morte, conseguimos criar um espelho de água, para dar a possibilidade de usufruto de um local fresco junto à água na entrada sul da vila, com vista para a igreja de São Tiago e para o convento. O Louriçal é uma terra bem trabalhada e bem cuidada.
Entrou no seu último mandato, que balanço faz do trabalho até agora?
Desde há nove anos, quando chegámos à Junta de Freguesia, que virámos uma página importante na freguesia. Desde a zona industrial que está agora em construção, com espaços vendidos e empresas a instalarem- se, ou o saneamento que está 75% concluído e cuja instalação está a acabar na nossa segunda maior localidade, o Casal da Rola. Asfaltámos dezenas de quilómetros, melhorámos o abastecimento de água, criámos um centro escolar moderno, com refeitório e cozinha, remodelámos a zona do rio Frio, onde agora são recebidos os grandes eventos da vila. Renovámos todo o parque escolar da freguesia e tivemos de fazer escolhas. Demos prioridade ao centro de saúde, que era uma obra urgente e que, mesmo assim, não está a funcionar como queremos, e quase tivemos de abdicar do centro cultural. A obra está feita e pronta a receber os médicos e a população. Esperamos agora que esta crise da falta de médicos tenha uma viragem e que aqui as coisas melhorem. Conseguimos fazer a recuperação do nosso património edificado histórico. Temos rede de telemóvel, fibra óptica moderna e renovámos a rede de abastecimento de electricidade. Temos 4080 eleitores e cerca de 4600 habitantes e sei que ainda não conseguimos satisfazer as necessidades de todas as pessoas e que há ainda muito trabalho a fazer, mas sinto que mudámos um pouco o rumo das coisas. Agora é preciso dar continuidade ao que foi realizado. Os equipamentos e as infra-estruturas base, resultantes de um investimento de mais de 200 mil euros, estão cá para assegurar o futuro da freguesia. A saúde financeira, é bastante diferente daquela que encontrámos e as contas estão estáveis. Temos defendido que haja a possibilidade de as pessoas poderem escolher livremente onde estudar e que a escola privada não seja o impedimento radical ditado pela tutela, o que possibilitaria ao Instituto do D. João V, que é um estabelecimento de ensino privado de renome, voltar a acolher muitos alunos da região e não apenas do Louriçal.