Opinião
Rede Cultura 27 – um erro com diversas falhas
Ainda nos devem muitas explicações, porque a RC27 só existe com o dinheiro público, o dinheiro de todos nós
A 22 de Fevereiro de 2019, 25 municípios assinaram o documento que oficializou a Rede Cultura 27 (RC27), enquanto plataforma de alavancagem para a candidatura de Leiria a Capital Europeia da Cultura em 2027 (CEC27).
Eis o erro estratégico!
A RC27, que vai de Sobral de Monte Agraço até Castanheira de Pera, abrange mais de 80 mil habitantes e tem quase 6 mil km2 de território, foi um projecto que assentou no frágil princípio de que 26 municípios formariam um núcleo cultural coeso para a promoção de Leiria.
O frágil princípio de que quanto mais escala, mais forte seria a candidatura, desprezando as diversidades identitárias e os objectivos políticos dos municípios envolvidos.
Este ano, no início de Março, recebemos a notícia de que Leiria ficou de fora da fase seguinte à CEC27, i.e., a RC27 falhou. Mas falhou desde a sua origem.
A Câmara Municipal de Leiria (CML) encomendou por 75 mil euros um estudo para que a RC27 fosse constituída enquanto cooperativa e a 22/3/21 o Tribunal de Contas chumbou a proposta (Região de Leiria, 24/3/21).
A verdade é que, desde a sua constituição, os cidadãos não foram informados sobre o montante de dinheiro público gasto neste projecto estrategicamente errático.
Recentemente, em reunião de câmara, foi referido que Leiria investiu mais de 250 mil euros na elaboração da candidatura (Região de Leiria, 22/3/22).
Mas a 25/3/21, o JORNAL DE LEIRIA noticiou que Leiria já tinha investido 750 mil euros na candidatura. Para além disso, o PSD concelhio sabe que há contratos públicos que indicam que o montante gasto ascende sobremaneira aos 250 mil euros.
Foram precisos séculos de luta contra a realeza para que o povo, através do voto democrático, autorizasse os seus governantes a fazerem despesas com o dinheiro público através dos orçamentos.
O facto de não haver um relatório de contas da RC27 e um conjunto de informações contraditórias sobre o dinheiro gasto viola os princípios fundamentais do Regime Financeiro das Autarquias Locais (Lei n.º 73/2013), no seu Artigo 7.º, sobre a transparência financeira que a CML deve prestar aos seus cidadãos.
Mas, afinal, quanto custou a RC27? E mais: a RC27 é para continuar ou para acabar? Caso continue, qual será o seu novo modelo e orçamento?
Uma outra falha grave da RC27 foi o não cumprimento do princípio da equidade e está documentado em actas de reuniões de câmara.
Entre 22/1/19 e 22/12/20 um só agente cultural de Leiria foi contemplado com 264 mil euros e para outros 15 projectos culturais de outros agentes a verba foi de 63 mil euros (Acta nº6/21).
No entanto, a informação ainda é contraditória. Na acta nº8/21 é referido que o tal agente cultural recebeu, ao fim e ao cabo, cerca de 37 mil euros e 148 mil euros em auxílio financeiro entre 2019 e 2020.
Mas com quais critérios? Não deveria existir um equilíbrio na atribuição do dinheiro público para os diversos agentes culturais do município e em todas as freguesias?
Os responsáveis da RC27 ainda nos devem muitas explicações, porque a RC27 só existe com o dinheiro público, o dinheiro de todos nós.