Opinião
Malaquias, o gato d’Ouro
O gato acompanhava Barnabé para todo o lado, à exceção de uma tarde, na semana, em que desaparecia, retornando ao final do dia
Barnabé, um homem pacato, solitário e de poucas posses, vivia na encosta de uma serra, junto a uma aldeia de pouca população. Vivia feliz, levando a vida ao sabor do vento, do sol, do crescimento das plantas e do nascimento dos animais.
Extremamente prestável, oferecia aos habitantes a amabilidade e o trabalho. Cortava-lhes a lenha, cuidava-lhes dos jardins, pintava-lhes os muros, arranjava-lhes os telhados, construía-lhes os galinheiros, supervisionava-lhes as hortas e as sementeiras.
Um dia um gato cruzou-lhe o caminho e tombou mesmo à frente dos seus pés.
Temendo o pior, o homem baixou-se, pegou no frágil animal e apertou-o contra o seu peito. O gato, pele e osso e que já mal abria os olhos aninhou-se saboreando um calor reconfortante. Barnabé, homem pacato, solitário, de poucas posses, mas de coração nobre, cuidou dele com tanto carinho e dedicação que, em poucas semanas, o animal se tornou possante, enérgico e cheio de saúde. O gato acompanhava Barnabé para todo o lado, à exceção de uma tarde, na semana, em que desaparecia, retornando ao final do dia.
Certa noite, Barnabé acordou com um ruído estranho e avançou até ao local onde uns gemidos aflitivos se sumiam. O gato ficara preso, pendurado pela coleira. O homem, não perdendo tempo, pegou num canivete e, num ápice, cortou a coleira que o estrangulava e, sem que nada o fizesse prever, um invólucro de plástico, cortado pela naifada, surgiu do seu interior.
Barnabé leu um texto que lá vinha embrulhado, de si para si: «Este é o gato Malaquias. Se este papel encontraste, um tesouro achaste! Se outro tesouro quiseres, segue o Malaquias para não te perderes.»
No dia seguinte, como que possuído, o gato girou como um autómato, sentando-se à porta, esperando que Barnabé a abrisse, como fazia de todas as vezes em que desaparecia. Malaquias partiu, então, ligeirinho, olhando para trás, como que a certificar-se de que não era seguido.
Meia hora de caminhada depois, deteve-se junto a uma árvore e, começou a escavar, de rabo levantado, lançando a terra pelo ar com quanta rapidez tinha.
Barnabé, que seguira o gato sem que ele desse conta, aproximou-se do buraco. Havia um brilho dourado, cintilante e ondeado reflexo de moedas de ouro que se espraiavam no interior de uma arca transparente onde uma pequena carta jazia. Com a curiosidade tatuada em cada poro do seu corpo, Barnabé leu: «Esta é a herança do Malaquias. Todos a queriam. Filhos interesseiros e amigos falsos e desonestos. Já bem perto de me ir, consegui enterrar o que tinha, aqui. É do Malaquias que, ao contrário dos humanos, foi o único que nunca me abandonou».
Barnabé ajoelhou-se e, instintivamente, começou a repor a terra. O gato imitou-o. Depois, juntos, calcaram tudo, com quanta força tinham e nunca mais voltaram àquele lugar.
Cada um encontrara no outro, o maior tesouro que podia existir.
Texto escrito segundo as regras do Novo Acordo Ortográfico de 1990