Economia

Thilo Brodtman: “Investigação e a inovação são a única forma de assegurar a criação de valor e de empregos”

26 out 2024 14:00

Director-executivo da VDMA - Federação das Empresas Alemãs de Engenharia, alerta para a transformação do sistema de comércio com maior hostilidade. Condena o roubo intelectual e diz que a IA ganhará muita importância

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Thilo Brodtmann
DR
Jacinto Silva Duro

Quais são, para si, os principais desafios que as empresas europeias enfrentam, na actualidade, não só no Mercado Comum, mas também quando fazem negócios no estrangeiro?

O mundo está a afastar-se de um sistema de comércio global baseado em regras, em direcção a um sistema mais conflituoso com um número crescente de barreiras comerciais. Os Acordos de Comércio Livre são cada vez mais difíceis de alcançar e isto coloca muita pressão sobre as indústrias orientadas para a exportação, como é o exemplo da engenharia mecânica. Os conflitos geopolíticos e as guerras põem em perigo as cadeias de abastecimento globais e assustam os investidores, factor que penaliza o potencial de crescimento global da indústria da Alemanha e da Europa.

Qual será o impacto das políticas ESG nas empresas da UE ao competirem com agentes económicos de fora da UE, nomeadamente da China/Ásia e dos EUA?

As questões Ambientais, Sociais e Governança (ESG) estão a tornar-se cada vez mais importantes. Estão a ser cada vez mais reguladas pelos legisladores e também são mais procuradas pelos clientes e investidores. E mais regulamentação virá. Por outro lado, os produtos sustentáveis continuam a ganhar importância junto do público. As empresas que apostam nos produtos certos têm uma boa hipótese de lucrar com os elevados padrões ESG. Contudo, para se manterem internacionalmente competitivas, as empresas não devem ser sobrecarregadas com burocracia e precisam de regulamentações fiáveis e harmonizadas dentro da UE com uma forte componente de fiscalização do mercado.

Na sua opinião, o que está a impedir que as várias associações nacionais de moldes, plásticos e ferramentas especiais sejam ouvidas pela UE, de modo a serem criadas regras legalmente vinculativas, para que os países não pertencentes à UE sejam, efectivamente, obrigados a cumprir as mesmas regulamentações?

Para a indústria de moldes e matrizes, podemos dizer que a importância estratégica do sector para a produção industrial global na Europa está, infelizmente, ligeiramente abaixo do nível de percepção dos políticos. No entanto, algumas associações nacionais, incluindo as de Portugal, da Itália e da Alemanha, iniciaram uma iniciativa conjunta no âmbito da ISTMA - International Special Tooling & Machining Association, com o objectivo de solicitar medidas por parte da Comissão Europeia, para restabelecer condições equitativas apicáveis às empresas europeias. Afinal, as empresas estão mais do que disponíveis e preparadas para enfrentar a concorrência, se esta for justa. Um aspecto interessante neste contexto, é que, por exemplo, o fabrico de moldes e matrizes, como um importante facilitador do futuro para muitas áreas da produção industrial, é muito valorizada na China. O potencial estratégico das ferramentas é bastante reconhecido nesse país e a indústria está a ser sistematicamente apoiada - também à custa das empresas europeias. As empresas de produção de maquinaria destinada à indústria dos plásticos representadas na VDMA também defendem a concorrência internacional e estão empenhadas em obter condições que sejam equitativas. Em princípio, as regras estabelecidas são dificilmente contestáveis. Pelo contrário, a vigilância do mercado já é um problema. A Europa tem um problema de aplicação das regras e mecanismos neste ponto e isto já foi repetidamente apontado também pela Euromap, a Associação Europeia de Máquinas de Plástico e Borracha.

Como pode a Investigação e Desenvolvimento ajudar a manter a tecnologia e as empresas europeias à frente da concorrência?

São essenciais para o futuro da Europa como centro industrial. A aposta na investigação e a inovação é a única forma de assegurar a criação de valor e de empregos, a longo prazo. A engenharia mecânica e de chão de fábrica fornece soluções para os desafios globais que vivemos actualmente. Para atingir esse objectivo, as empresas precisam de condições estruturais favoráveis à inovação. Naturalmente, isto inclui um financiamento de investigação acessível e com grande capacidade de investimento, bem como a garantia da base de mão-de--obra qualifiada, para a investigação e inovação.

Como podemos combater a violação dos direitos de autor?

A VDMA inquire regularmente as suas empresas associadas sobre o estado das violações de direitos de autor, o último inquérito foi realizado no início de 2024 (VDMA Studie Produktpiraterie). Os últimos inquéritos mostram que os danos causados pelas violações de direitos de autor, embora sejam ainda bastante elevados, diminuíram, devido ao facto de as empresas tomarem mais medidas legais contra os plagiadores. A China continua a ser a principal fonte de violações de direitos de autor. Além de combater o plágio “clássico” de hardware, é necessário investir cada vez mais recursos na protecção das empresas contra ataques cibernéticos destinados a roubar propriedade intelectual. Assim, a meu ver, os orçamentos para combater os crimes cibernéticos têm de ser aumentados.

A escassez de trabalhadores qualificados é um problema para todas as economias europeias. A Europa pode lidar com a redução de mão-de-obra especializada? Veremos, num futuro próximo, a incorporação de mais IA e robótica?

A escassez de mão-de-obra qualificada é um dos principais desafios para a indústria europeia e uma tarefa importante para todas as empresas. Em parte, este problema pode ser resolvido atraindo mais trabalhadores estrangeiros com a ajuda de uma política favorável à imigração. Mas as empresas também precisam, definitivamente, de fazer uso da digitalização, automatização e ferramentas de IA, para preencherem as faltas de mão-de-obra. Os robôs já são uma presença constante nos locais de produção modernos e a sua utilização aumentará nos próximos tempos. O uso industrial da IA está numa fase inicial, mas é previsível que ganhará muito mais importância muito rapidamente. Todas as empresas estão, portanto, sob pressão para compreender os benefícios da IA para o seu negócio específico e incluí-la nas suas operações diárias.

A VDMA representa cerca de 3.600 empresas de engenharia, tornando-a uma das maiores associações industriais da Europa. Qual é o segredo do vosso sucesso? Como encontram um terreno comum para os problemas e necessidades dos vossos membros?

O sucesso da VDMA baseia-se na sua longa tradição de representar uma das principais indústrias da Europa numa rede única, que adquire a sua força a partir do conhecimento industrial e do empreendedorismo das suas empresas associadas. A maioria dos nossos membros são empresas familiares, orientadas para o longo prazo, que pensam em gerações e não em relatórios trimestrais. Assim, a VDMA é a porta-voz da espinha dorsal industrial da Alemanha e, cada vez mais também, dos seus homólogos europeus, à medida que a nossa associação cresce continuamente para lá das fronteiras alemãs. Existe um conjunto comum de valores que une todas estas empresas e que a VDMA defende: economias democráticas e liberais baseadas no mercado, livre comércio, regras que ajudem o empreendedorismo e uma concorrência justa e bem regulada, a nível doméstico e nos mercados mundiais.

Abstract: Thilo Brodtman: “Companies need balanced regulation to remain competitive”

VDMA’s Executive Director Thilo Brodtmann identifies a shift from rules-based global trade towards a more confrontational system with increasing trade barriers.
 
This change pressures export-oriented industries like mechanical engineering, with geopolitical conflicts threatening supply chains and deterring investors.
 
Environmental, Social, and Governance (ESG) issues are gaining importance, increasingly regulated and demanded by customers and investors. Sustainable products offer opportunities, but companies need balanced regulations to remain competitive.
 
The die and mould industry, despite its strategic importance, lacks political recognition in Europe. National associations are working through ISTMA to restore a ‘level playing field’.
 
China, recognising the sector’s potential, actively promotes it at Europe’s expense, says Mr. Boadtmann.
 
VDMA-represented plastics machinery companies advocate for fair competition, but highlight Europe’s market surveillance and enforcement challenges.
 
Research and innovation are crucial for Europe’s industrial future, requiring supportive frameworks and funding.
 
Copyright infringements remain a concern to European companies, with China as the primary source.
 
Companies are increasingly fighting cyber-attacks targeting intellectual property.
 
The skills shortage is a major challenge, partially addressable through immigration-friendly policies.
 
However, companies must also embrace digitalisation, automation, and AI to fill labour gaps.
 
VDMA’s strength lies in its network of long-term oriented, family-owned businesses.
 
It represents Germany’s industrial backbone and increasingly European counterparts, advocating for democratic, liberal marketbased economies, free trade, and fair competition.
 
In this evolving landscape, European industry must balance adaptation to new realities with preserving core strengths to maintain global leadership.