Economia

Quotas de pesca aumentam mas preço para consumidor é centenas de vezes superior ao praticado na lota

22 dez 2024 17:00

Portugal negoceia quota de pesca para 2025, mas sector enfrenta desafios como falta de mão-de-obra, renovação da frota e défice comercial de 1.100 milhões entre produção e importação

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Aumento das quotas equivale a um “acréscimo monetário”, no valor de 2,8 milhões de euros
Fotografia: Ricardo Graça/Arquivo
Jacinto Silva Duro

Portugal vai poder pescar mais em 2025, após a negociação de fixação de quotas com a União Europeia.

Os pescadores nacionais poderão capturar cerca de 18 mil toneladas no próximo ano, segundo informou a secretária de Estado das Pescas, Cláudia Aguiar.

O aumento das quotas equivale a um “acréscimo monetário”, no valor de 2,8 milhões de euros.

Os armadores da região ainda não receberam os números dos portos locais, por isso, antes do final de Janeiro, não deverão saber em quanto a quota irá aumentar na Nazaré, Peniche e na arte xávega.

João Paulo Delgado, presidente da Mútua dos Pescadores, considera que é sempre positivo quando os números das capturas sobem, contudo, sublinha, há que recordar que o “alarmismo” pré-negocial com cenários de cortes, vai desvanecendo à medida que os trabalhos prosseguem.

“Este ano, há quotas maiores para a pesca em 2025 e mais milhões de euros no valor total do pescado previsto”, reconhece este dirigente, lembrando que Portugal atingiu, recentemente, uma melhoria nos seus stocks de pesca e, que , por isso, “não se justificariam cortes”.

O número

1.100

milhões de euros é o valor do défice comercial entre a produção [pesca pela frota nacional] e a importação resultante da aquacultura

João Paulo Delgado realça ainda o facto de as quotas para determinadas espécies não terem sido esgotadas no ano que termina, como aconteceu com o carapau, por não haver capacidade de pesca e por os pescadores terem preferido apontar a sua mira a espécies mais lucrativas.

Também Humberto Jorge, presidente da Associação Nacional das Organizações da Pesca (ANOP) do Cerco, em declarações à agência Lusa, fez, na semana passada a mesma crítica.

“Estávamos neste momento a pescar em algumas zonas do País só sardinha, que tem sido extremamente valorizada e encaminhada para o abastecimento da indústria conserveira portuguesa, portanto não havia necessidade de ter parado antes de se esgotar a quota e as possibilidades de manter a frota portuguesa” a operar.

Este dirigente explicou que o limite anual de capturas atribuído a Portugal em 2024 terá esgotado, mas ainda restavam 2.700 toneladas de 2023.

O Ministério das Pescas justifica o encerramento das capturas devido a um parecer científico do IPMA que o aconselhou devido a “motivos de ciclo biológico da espécie” e após ouvir auscultar o sector. Venda em lota cada vez mais desvalorizada

O esmagamento dos preços, na primeira venda em lota, é outro problema que, para João Paulo Delgado, tem de ser abordado e regulado.

O presidente da Mútua dos Pescadores aponta o dedo à diferença entre o valor pago “à produção” [pescadores] na lota e aquele que é desembolsado pelo consumidor nas grandes superfícies.

A contestação não é de agora, contudo, de ano para ano, o fosso está a alargar, chegando, nalguns casos como o da sardinha, o do carapau ou do biqueirão, a 700 ou 800% de diferença. “Os hipermercados pagam preços irrisórios na lota e cobram dezenas de euros ao consumidor pelo mesmo peixe”, acusa, justificando com valores obtidos durante um trabalho académico da sua autoria, onde comparou, durante dois anos, as diferenças de preço entre a lota e as grandes superfícies.

“Há ainda a questão das categorias. Na venda em lota, há várias dimensões à venda -T1, T2, T3, T4, T5 -, todas com preços diferentes, mas, nas grandes superfícies, há apenas três, o que permite vender pescado de categorias inferiores a preços superiores”, diz apontando ainda outro “artifício” que passa por vender peixe comprado barato por ter dimensões pequenas, mas vendido, “à posta, como se fosse de tamanho maior, a preço mais elevado”.

Portugal é o terceiro maior consumidor de pescado a nível mundial, estimando-se que cada português consuma 57 quilogramas de peixe por ano, apesar disto, o cenário não é animador.

A frota necessita de renovação, sendo que as duras condições de trabalho afastam a já pouca mão-de-obra, para quem a formação tem sido gradualmente reduzida.

“Em 2019, por Decreto-lei, foi eliminada a profissão de pescador. Agora são todos marinheiros e isso diz muito daquilo que se planeia para o sector”, afirma João Paulo Delgado, sublinhando que o défice comercial da pesca é de mais de 1.100 milhões de euros, entre produção e importação resultante da aquacultura de países como Espanha.