Sociedade

Pedrógão Grande: o primeiro Natal na casa nova tem lágrimas e sorrisos

21 dez 2017 00:00

Meio ano após o incêndio, há 106 famílias a quem o Estado já substituiu a habitação permanente.

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Seis meses depois da tarde em que escaparam à morte, à frente do fumo e das chamas, Joaquim e Edite Godinho voltam a ter habitação própria. No sítio de sempre, com mais diferenças do que semelhanças. A chave chegou no sábado, 16 de Dezembro, a tempo do Natal, numa cerimónia presidida pelo primeiro-ministro, António Costa. Mas em Vale de Nogueira continuam a faltar os momentos onde nasce a identidade, aqueles pequenos nadas que são tudo, transformados em cinzas pelo incêndio de 17 de Junho no concelho de Pedrógão Grande. O ouro guardado ano após ano, a roupa que já era segunda pele, as memórias em papel de fotografia. Dão lugar a um vazio de negro tingido, que a família preenche com a ajuda de amigos e desconhecidos, numa corrente de solidariedade que não conhece distâncias, do norte ao sul do País. "Nunca pensei passar por esta situação e também não sabia que havia pessoas de tão bom coração", comenta Joaquim Godinho, o último a deixar o perigo para trás naquele corropio de diabos. "Só não perdi a vida, por pouco, mas não perdi". Agora há uma cozinha a estrear, mobília oferecida por alguém do Porto, uma televisão que volta a ser janela para o mundo e um tecto debaixo do qual os sonhos se reagrupam. Uma casa "mais pequena", que "não é a mesma coisa", admite Edite Godinho. Mas uma casa a que eles e os filhos, já adultos, podem colar a palavra "nossa". E é aí que a pertença começa. Até um dia custa, quanto mais seis meses.

Com o Natal à porta, Joaquim e Edite, 54 e 53 anos de idade, têm mais um motivo para sorrir. A mesma empresa que pagou a nova habitação vai reerguer os anexos, tão importantes para a subsistência familiar, dependente em boa medida do que a terra dá. Ele está desempregado há um ano, ela ajuda a irmã na venda ambulante. "Vão oferecer-nos a construção dos anexos. Estou muito contente. Foi a melhor notícia que me podiam dar, porque assim já posso fazer as coisas que antes fazia. O fumeiro, os presuntos do porco, tudo. E agora não tenho onde faça nada", explica Edite Godinho. Naquele 17 de Junho, o marido queimou-se numa mão e na cara, quando procurava salvar os animais. Alguns morreram, outros sobreviveram, mas com ferimentos. Quando as chamas pegaram à casa, as botijas de gás vazias rebentaram e toda a estrutura estremeceu, obrigando a reconstruir de raiz. Não esquecem a noite em sobressalto no centro de saúde, e o regresso, ainda com o incêndio activo, só para encontrar a rotina interrompida, a respiração suspensa.

O primeiro Natal do resto das vidas deles, de todos os que nos concelhos de Pedrógão Grande, Castanheira de Pera e Figueiró dos Vinhos encararam o inferno e estão aí para contar, não podia nunca ser um Natal igual aos outros. Nem mesmo para os que já têm casa – 40% dos lesados, de acordo com o balanço da Unidade de Missão para a Valorização do Interior. Vai ser um Natal "mais fraco", porque "não há dinheiro", diz Edite Godinho. Mas também "não há aquela alegria" de outros anos. E é fácil perceber porquê. "Toda a gente que morreu conhecíamos. Toda a gente".

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