Viver

Observadores já não são uma ave rara

26 set 2019 00:00

Há cada vez mais portugueses apaixonados pela observação de aves. A região de Leiria não escapa à tendência, onde se multiplicam espécies e locais privilegiados para as conhecer

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Daniela Franco Sousa

No próximo dia 5 de Outubro, o evento anual EuroBird- Watch celebra o seu 25.º aniversário e em Porto de Mós o dia ficará repleto de actividades para os amantes da observação de aves. A poucos dias da grande efeméride, o JORNAL DE LEIRIA foi saber que motivações, paixões e rotinas regem o quotidiano de quem há muito se rendeu a este passatempo.

Pedro Ramalho, de 45 anos, diz que sempre gostou de aves. Foi foi há 11 anos que começou a fazer observação “mais a sério”. Funcionário público na Escola Superior de Turismo e Tecnologia do Mar, em Peniche, Pedro Ramalho explica que esta paixão exige alguma disponibilidade de tempo, bem como algum equipamento.

O material básico consiste nuns binóculos e numa máquina fotográfica, mas pode ir muito mais além, com a aquisição de um telescópio, de melhores máquinas e lentes que, no total, podem custar cerca de 10 mil euros. Além de gosto, tempo e algum material, esta actividade também pressupõe adquirir conhecimentos de forma a que se perceba aquilo que se vê.

Pedro Ramalho salienta que existem várias pessoas com bastante conhecimento sobre a matéria, a quem é possível pedir ajuda na identificação das espécies, seja através do envio de fotografias seja através do registos áudio das aves. A evolução da internet e das redes sociais veio facilitar bastante este processo, reconhece Pedro Ramalho.

Além do auxílio de especialistas, o funcionário público recomenda a todos os que se queiram iniciar na observação de aves, que adquiram um bom guia, como o Guia Aves da Europa, que identifica as várias aves que são passíveis de encontrar neste continente. Mas será a observação de aves um passatempo ou uma competição? Pedro Ramalho explica que esta actividade pode ter essas duas facetas.

Se muitos se limitam a sair para o campo para apreciar aves, sem a mínima intenção de competir, há também quem tente bater recordes no número de espécies diferentes observadas num só dia, exemplifica o funcionário público. Mas não será isso uma mera questão de sorte, perguntar- se-ão alguns?

Nem por isso, sublinha Pedro Ramalho. Para chegar a um número elevado de espécies diferentes avistadas em 24 horas é preciso não só conhecê-las bem, saber quais são os locais onde podem ser encontradas, a que horas do dia e época do ano, como também é necessário planificar muito bem todo o percurso a ser cumprido de maneira a observar o maior números de aves possível. E essa planificação chega a ser feita “ao milímetro”, com noção exacta onde se pode estacionar o carro e quanto tempo pode demorar uma caminhada até ao local onde a espécie se encontra.

“Só essa precisão permite 'encaixar' um grande número de espécies observadas em 24 horas”, realça Pedro Ramalho. E é com relativa facilidade que uma pessoa pode observar 290 espécies de aves em Portugal durante um ano. Observar mais espécies envolverá depois mais disponibilidade de tempo de dinheiro para as deslocações. Embora pareça ser uma comunidade muito competitiva, na verdade não o é, frisa Pedro Ramalho, que explica que muitas das saídas para o campo até são feitas em grupo, como forma poupar recursos.

Distrito tem localizações privilegiadas

A morar em Caldas da Rainha e a trabalhar em Peniche, o funcionário público tem condições privilegiadas para fazer observação de aves. Afinal, do seu ponto de vista, Peniche e a Lagoa de Óbidos são os melhores locais da região para o fazer. “São muitas as pessoas que vêm ao distrito de Leiria com o propósito de visitar estes locais. Peniche é a melhor zona do País para fazer observação das espécies marinhas.

Já a Lagoa de Óbidos prima pela diversidade de aves. Terá, nesta fase do ano, 60 a 70 espécies diferentes”, justifica Pedro Ramalho. Entre as 390 espécies de aves diferentes que já observou em Portugal Continental, o funcionário público tem algumas preferidas. Uma das mais raras que já viu foi a gaivota marfim. A ave habita no Árctico, junto aos ursos polares, mas foi vista pela primeira e única vez em toda a Península Ibérica, na Nazaré. “Havia pessoas a vir de Espanha e que já não chegaram a tempo de a ver”, recorda Pedro Ramalho. “Eu também já falhei duas observações e dói sempre um bocado”, confidencia.

Outra das espécies que destaca é o abelharuco persa, natural do Norte de África, mas que apareceu perto de Castro Verde. Foi a primeira vez que aquela espécie foi vista em Portugal e, apesar de pesar cerca de 100 quilos, Pedro Ramalho não deixou de subir a uma colina para observar a ave. “A sensação de liberdade” que transmitem e as particularidades dos seus comportamentos atraem este funcionário público que diz conseguir conciliar bem o tempo para a família e o tempo para a observação.

“Os andorinhões, que na região de Leiria são todos pretos, e são óptimos voadores, bem como o caimão, uma ave bonita, que pega na vegetação com as patas levandoas ao bico”, são outras das suas espécies preferidas. Natural de Leiria e a residir em Aveiro, também Rui Cordeiro reconhece que a zona marítima de Leiria é muito interessante para realizar observação de aves. Não só Peniche, como refere Pedro Ramalho, mas também outras localidades, como a Praia do Pedrógão, onde entre Setembro e Outubro é possível encontrar o ganso patola, exemplifica este observador.

Aos 55 anos, o gestor do programa Erasmus já se dedica à observação de aves há cerca de três décadas, contabilizando mais de 300 espécies observadas. Além deste passatempo, que lhe proporciona “sensação de liberdade”, lhe treina a “paciência”, a “metodologia” e lhe exige “conhecimentos para descortinar as espécies”, Rui Cordeiro tem -se voluntariado para: estudar o impacto das linhas de média e alta tensão nas aves; organizar encontros de observação; realizar censos sobre os animais; promover sessões de educação ambiental, entre muitas outras actividades.

Além de Portugal, Rui Cordeiro já fez observação de aves na Islândia, na Polónia, na Bielorrússia, na Tailândia e no México. Nem sempre viaja com esse propósito, mas o seu momento de observação acaba sempre por acontecer em todos os seus destinos. A sua experiência permite-lhe afirmar que o número de espécies se tem mantido estável em Portugal. Há no entanto populações mais reduzidas, fruto de vários factores, um deles a agricultura intensiva, que veio alterar as formas de maneio do campo. A rola brava é o exemplo de espécie da zona de Leiria que tem vindo a decrescer, expõe Rui Cordeiro.

Número de observadores cresce em Portugal

João Tomás, de 29 anos, sempre gostou de animais. Natural da Batalha, fez curso de Clínica Veterinária na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro e fez voluntariado no Centro de Ecologia, Recuperação e Vigilância de Animais Selvagens, em Gouveia. E foi nesse centro, por influência de um médico, que fazia observação de aves, que João Tomás tomou o gosto pela actividade, em 2010.

Desde então, o jovem já observou cerca de 340 espécies diferentes, mas salienta que não o faz na perspectiva da competição. Explica que o faz por paixão, também por gostar de monitorizar e de descobrir novas aves. É um entre os muitos portugueses que cada vez mais se rendem à observação de aves, “desde os profissionais, os apaixonados e os fotógrafos, que já serão mais de uma centena”, estima João Tomás. Um númeromuito superior em relação ao que acontecia nos anos 90. Nessa época já Inglaterra tinha grande tradição nesta actividade e ainda Portugal não reunia uma mão cheia de aficionados, realça João Tom&

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