Sociedade
Engenheiro de Caldas da Rainha dirige fábrica nos Emirados Árabes Unidos
Marco Gonçalves foi desafiado por um sheik árabe a desenvolver lacticínios à base de leite de camelo
O desafio foi-lhe lançado por um sheik árabe, quando trabalhava num palácio, que lhe perguntou se sabia fazer queijo com leite de camelo. “Não sei, mas vou tentar”, respondeu-lhe Marco Gonçalves, engenheiro agro-industrial, natural de Caldas da Rainha a viver nos Emirados Árabes Unidos há quase três anos. Passados “alguns meses” daquela conversa, já tinha criado uma fórmula para a confecção de queijo a partir de leite de camelo ao ponto de ser comercializado.
O desafio seguinte, era montar a operação para a produção, incluindo o enquadramento legal. “Teve de ser tudo criado de raiz, desde a fórmula para o queijo até à legislação”, recorda o engenheiro, que dirigiu o projecto de lançamento da primeira fábrica de lacticínios com leite de camelo, supervisionando todas as fases, desde a pesquisa e desenvolvimento de produto, até ao posicionamento no mercado e a componente legislativa.
A comercialização dos produtos lácteos à base de leite de camelo arrancará ainda no primeiro trimestre de 2025, havendo “mais duas unidades projectadas” para o novo ano. Marco Gonçalves explica que este empreendimento faz parte de uma estratégia governamental para desenvolver o sector agro-pecuário, um dos alicerces económicos dos Emirados Árabes Unidos que “tem muitas potencialidades”, algumas ainda por explorar.
“Há uma tradição forte ao nível da agricultura e da criação de gado, que é importante valorizar com novos produtos, que sejam inovadores”, defende, adiantado que está também a trabalhar na criação de uma cooperativa agro-industrial.
Estudos em França
A viver em Fujeira, cidade banhada pelo Golfo de Amã, Marco Gonçalves assume que “desde sempre” soube que queria ter uma experiência internacional, que lhe pudesse “abrir horizontes”. A este propósito, recorda um episódio passado em casa da avó, quando tinha “uns cinco ou seis anos”.
“Peguei numa pequena mochila e coloquei lá dentro umas t-shirts que ela tinha acabado de passar a ferro e disse que queria ir embora, viajar e conhecer o mundo”, conta. A partida seria, no entanto, adiada até aos 18 anos, quando foi estudar na Ecole Nationale d’Industrie Laitiere, em La Rochelle, França.
Depois de seis anos em terras gaulesas e de curtas experiências profissionais em Espanha e Inglaterra, Marco Gonçalves regressou a Portugal, trabalhando durante 11 anos na Inprolac. Em 2021, decidiu “fechar o ciclo” no País. Juntamente com a esposa, terapeuta da fala natural de Braga, que deu aulas na Escola Superior de Saúde de Leiria, começou a procurar emprego na zona do Golfo Pérsico, por ser uma região “segura e com muitas oportunidades”.
A primeira proposta veio do Bahreïn, mas não aceitou. Entretanto, a esposa conseguiu emprego numa clínica em Abu Dhabi e acabaram por se mudar para os Emirados Árabes Unidos. A adaptação, diz, foi “fácil”, a começar pela língua, uma vez que “o Inglês é idioma oficial de trabalho”.“É um país anglófono. Muitas vezes, aprendem o Árabe como segunda língua”, conta o engenheiro, de 37 anos, que destaca a multiculturalidade do território, que acolhe “pessoas de 250 nacionalidades diferentes”.
Também a matriz cultural “é parecida com a portuguesa”. “Juntam-se ao fim-de-semana com a família, para almoçar ou jantar. É algo muito importante para eles, assim com as figuras femininas, não só a mãe e avó, mas também as filhas e as tias”, partilha, destacado ainda a componente religiosa, que continua a ter um espaço muito relevante.
“Vejo semelhanças no que acontecia em Portugal há 40 ou 50 anos. Ainda me lembro de a minha avó ir à missa com o lenço na cabeça. Nós, desviámo-nos um pouco da prática religiosa, que eles continuam a manter de forma muito forte”, compara Marco Gonçalves, que não tem planos para regressar, em definitivo, a Portugal. “Gostamos muito de ir de férias, visitar a família e os amigos, mas voltar para trabalhar está fora de questão”, assume