Sociedade

Crianças combatem isolamento de idosos em praceta no centro de Pombal

28 jul 2025 09:00

Iniciativa está integrada na rede Breaking Isolation e na Participation4All

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Marta participou na reunião com os adultos, e deu a sua opinião
DR
Alexandra Barata

Desde que as irmãs Mariana e Mafalda Fontes abriram a Fábrica das Festas, há oito anos, onde dão apoio ao estudo e organizam campos de férias, na Praceta José António O. Bimba, situada no centro de Pombal, a presença das crianças veio alegrar a vida dos idosos que ali moram.

Este ano, a criação de um projecto-piloto no local, para testar o Programa Municipal de Promoção da Vizinhança, pôs as duas gerações a pensar em pequenas intervenções no espaço público e, desde então, houve uma aproximação maior entre todos.

“Toda a gente concordou em tirar daqui os carros, para termos espaço para brincar”, conta Marta, de 10 anos. “Os meninos podiam jogar à bola e podíamos saltar à corda, fazer jogos, e desenhar com o giz no chão”, sugere Lara, de 9 anos. “Mas houve um menino que queria que deixassem um espaço para a mãe poder estacionar o carro quando o fosse buscar”, recorda Cláudia Costa, de 44 anos, dinamizadora do projecto e técnica do Gabinete de Desenvolvimento Sustentável e Felicidade da autarquia.

As ideias surgiram durante um encontro na Fábrica das Festas, no dia 18 de Fevereiro, para o qual o município convidou todos os moradores, a presidente da Junta de Freguesia de Pombal, parceira do projecto, e técnicos do Urbanismo, Desenvolvimento Social e Saúde.

As 12 crianças da Fábrica das Festas e os 12 residentes na praceta foram distribuídos por três grupos e, depois de terem reunido, apresentaram as propostas aos outros. “Os vizinhos concordaram com as nossas ideias, e queriam um novo chão”, adianta Marta.

“Outro grupo propôs pôr uma mesa na praceta para as crianças lancharem. Achei interessante, porque não estavam a pedir nada para eles, mas para as crianças”, conta Cláudia Costa. E a mesa em madeira, com bancos corridos, já foi colocada no passeio em frente à Universidade Sénior, tal como uma floreira, que também foi sugerida nessa reunião.

A manutenção dos lugares de estacionamento, utilizados pelos utentes do Hospital Distrital de Pombal, por serem gratuitos, é que foi menos consensual.

“Uns querem manter, outros não”, explica. “Também gostávamos de ter um parquezinho, mas os adultos receiam que venham pessoas de fora, e que isso afecte o espírito de vizinhança”, refere Mariana Flores, de 35 anos.

“Sempre que está bom tempo, vimos com as crianças para a rua, onde saltam à corda e jogam às escondidas. Viemos dar muita vida à praceta, tanto que os vizinhos dizem que se nota logo quando estamos de férias”, comenta, sorridente.

A ideia de participar no projecto-piloto foi, por isso, aceite com entusiasmo pelas sócias da Fábrica das Festas. “Sou do tempo em que brincávamos na rua, e hoje isso já não se faz, nem há a ligação entre as pessoas”, afirma Mariana. “Mas o que se vive aqui é muito diferente. Desde o início, acolheram-nos muito bem. Tratamo-nos todos por vizinho, e há sempre um ‘bom dia’ ou ‘boa tarde’”, conta.

“Há muitos idosos que estão sozinhos e, se acontecesse alguma coisa, ninguém saberia. A ideia é criar essa ligação”. “O objectivo do projecto é tornar o espaço público a nossa sala de entrada, onde recebemos as pessoas, e estimular o sentimento de pertença”, confirma a técnica do Gabinete de Desenvolvimento Sustentável e Felicidade.

“Os laços são extremamente importantes, e ter crianças a lanchar na rua é um motivo para os idosos saírem de casa e virem ver o que estão a fazer”, concretiza. “Se calhar, ficam a pensar na infância que tiveram, e ficam mais felizes por nos verem a divertir”, observa Lara.

Residente do prédio junto ao qual foi colocada a mesa, Lurdes Meneses, de 79 anos, considera o projecto importante para as crianças e para os moradores, por se destinar a combater o isolamento dos idosos, apesar de confessar que estar na rua não a entusiasma. “Mas gosto muito de os ouvir. Infelizmente, não tenho netos, mas gosto muito de crianças”.

Cláudia Costa revela que, no âmbito deste projecto-piloto, vai ser feito um projecto para a reabilitação urbana da praceta, e há ainda a intenção de homenagear o mestre Bimba, falecido há 30 anos, por ter sido um dos fundadores da cooperativa de moradores, através da pintura de um mural na parede de um dos edifícios.

“A ideia é criar um regulamento, para implementar o Programa Municipal de Promoção da Vizinhança noutros locais”, adianta a técnica do município. “Queremos que as pessoas falem umas com as outras, criem um projecto para conviverem mais, e concorram com os seus espaços. Depois, reunimos para ver quais as ideias exequíveis. Temos de tentar mudar o paradigma”, sublinha.

A autarquia pretende, assim, que os cidadãos apresentem projectos para melhorar o espaço público, transformando bairros, urbanizações ou lugares em pontos de encontro, e promovendo o sentimento de pertença à comunidade, com o apoio do município em “pequenas intervenções”.

O projecto-piloto resulta da participação na rede Breaking Isolation, financiada pelo Programa Europeu URBACT, e na iniciativa Participation4All, impulsionada pela United Cities and Local Government, a Câmara Municipal de Valongo e a Universidade de Aveiro.

O objectivo principal da rede Breaking Isolation é combater o isolamento social, e o projecto Participation4All destina-se a melhorar a qualidade da democracia local, dando a oportunidade aos cidadãos de se pronunciarem em relação aos seus interesses e necessidades, para usufruírem do espaço público enquanto elemento promotor da socialização.