Viver

Bons Sons é um festival com a identidade de outros tempos e acontece às portas de Leiria

7 ago 2017 00:00

Cem Soldos é uma típica aldeia a dois passos de Tomar. Na maior parte do ano, é uma aldeia igual às outras da região. Mas, em Agosto, em vez do tradicional arraial, os habitantes juntam-se e organizam o melhor festival português de música nacional.

Jacinto Silva Duro

Veja a fotogaleria

Até a igreja tem um palco lá dentro.

Viver a Aldeia ao som da mais contemporânea música portuguesa é o apelo que o Bons Sons, que acontece em Cem Soldos a dois passos de Tomar, lança aos 40 mil espectadores que ali são esperados entre 11 e 14 de Agosto, para ouvir Capitão Fausto Virgem Suta, Mão Morta, Né Ladeiras, Medeiros/Lucas, Orelha Negra, Samuel Úria, Rodrigo Leão e Frankie Chavez, entre muitos outros artistas e eventos.

Ali, todos os habitantes ajudam a montar o festival. Do padre à avó de 90 anos, dos mais novos aos mais velhos, todos encontram um lugar no contributo para o bem-comum. A recompensa são vários projectos de desenvolvimento local e cultural.

Em Cem Soldos, não há casas ao estilo maison, apenas lares em adobe ou tijolo em tons de branco debruado a amarelo e em cujas soleiras gatos preguiçosos dormem para espantar o calor.

O nome, reza a história entre os locais, será evocativo de uma antiga portagem romana que ali existia para a localidade de Caldede. O pagamento seria de... 100 soldos. Mas toda a pacatez é aparente. No café da Tonita, no centro da aldeia, por estes dias, já só se fala do evento que vai acontecer em menos de duas semanas enquanto, nas ruas, grupos de jovens pintam paredes, cortam arbustos, limpam ervas e montam barracas.

“O que se passa? Vem aí o Bons Sons!”, resume João Cotovio, 21 anos, um dos jovens que, de trincha na mão, caia o casario. Entre 13 e 16 de Agosto, oito palcos, 45 bandas que representam o que de melhor se faz na música nacional.

Neste festival único, onde se “vive a aldeia”, os palcos são as ruas, os largos, uma eira e até a igreja. É um festival português, com certeza, independentemente do nome das bandas ou do facto de a língua de Shakespeare poder ser mais comum em palco, que a ditosa e amada de Camões.

É o o mais português dos festivais porque abre os braços aos projectos portugueses e a uma nova geração que procura características diferenciadoras na música nacional. "São os grupos 'mais portugueses' que têm mais sucesso no estrangeiro e não os que mimetizam a dinâmica anglo-saxónica", diz Luís Ferreira, o director do evento.

Gente feliz com olheiras
No largo de São Pedro, a dois passos da "associação" – designação por que é conhecido o Sport Club Operário de Cem Soldos (SCOCS), que organiza o evento - um grupo de voluntários da terra limpa e prepara uma parede para ser pintada. Ali será o palco Giacometti.

Durante o dia a aldeia pertence em exclusivo às equipas formadas por jovens da terra e arredores, dos 12 aos 18 anos, que queiram colaborar. Assim que o lusco-fusco se aproxima, o número de trabalhadores aumenta, à medida que os aldeões largam os afazeres diários para irem ajudar a montar o Bons Sons.

"Trabalha-se até ao sol se pôr e depois continua-se noite dentro", explica a organização. O núcleo duro dos trabalhadores é constituído por 50 pessoas, havendo ainda mais 200 voluntários da aldeia e 70 de todo o País. "Temos gente que vem do Algarve, de Trás-os-Montes e de aldeias das redondezas e de Tomar". 

A aldeia com não mais de 700 habitantes, parece um pequeno estaleiro. Engalana-se, lava a cara e maquilha-se no meio do riso e alegria dos jovens voluntários. Por aqui e ali, passam pequenos tractores carregados com materiais, ao ritmo de martelos que agridem pregos.

A edição deste ano do Bons Sons marca a passagem ao formato anual, depois de, até agora, se ter realizado de dois em dois anos. Pela aldeia estão espalhados vários cartazes com pedidos de voluntários entre a população local.

“Assinale a sua disponibilidade”, solicitam. E a população responde afirmativamente. As avós, um grupo coeso que conta no seu seio com algumas senhora com 90 anos, fabricam parte do merchandising. A elas cabe coser as “tixas”, a lagartixa mascote do evento. Juntam-se todos os dias à tarde de agulha em riste.

Dos mais novos aos mais velhos todos encontram um lugar no contributo para o bem-comum, e esse é um dos elementos mais inspiradores e mais importantes do festival.

Recuemos ao não tão afastado ano de 2006. O SCOCS comemorava 25 anos de existência e era preciso uma ideia original para marcar a data. Luís Ferreira, com 21 anos na época, chegou-se à frente e apresentou à Direcção a sua visão de um festival que aliasse a música portuguesa ao ambiente natural da aldeia.

O resto é história. Ao longo destes anos, o festival foi-se refinando, ganhando algumas valências e aligeirando outras.

Para ver a programação completa, clique aqui.