Opinião
O abuso do uso: celebrar o dia internacional do antibiótico
Foram os antibióticos que mudaram o nosso mundo. Mas têm ação limitada
Há coisas tão importantes que merecem ser destacadas. Uma delas, claramente, são os antibióticos.
No último século, a Humanidade evoluiu vertiginosamente, a todos os níveis. Mas talvez nada disso teria acontecido se Sir Alexander Fleming não tivesse descoberto a penicilina...
O advento dos antibióticos no início do século XX permitiu, pela primeira vez na História, um aumento tremendo na esperança média de vida, de 47 para 79 anos.
Com este poder sobre as infeções, o que hoje para nós é um simples corte numa mão, só há um século atrás deixou de ser preocupação.
E assim passámos a ter mais tempo para implementar e testar ideias disruptivas, que serviram de base à (r)evolução que hoje vivemos.
Contudo, apesar destes nossos enormes avanços, estamos hoje a ser obrigados a repensar a nossa abordagem às infeções e uso dos antibióticos.
As bactérias “aprendem”, com rapidez e precisão, a resistir à sua ação. E pior, transmitem essa capacidade, rápida e eficientemente, a outras bactérias.
E hoje, enquanto lemos isto, vários doentes estão a morrer por infeções intratáveis, causadas por bactérias resistentes a todos os antibióticos disponíveis.
Fleming, já no seu discurso de aceitação do prémio Nobel pela descoberta da penicilina, alertou para o problema das resistências aos antibióticos.
Mesmo antes da sua utilização clínica, o próprio observou, em laboratório, que algumas bactérias adquiriam rapidamente capacidade de sobreviver à ação da penicilina.
E, humildemente, deu grande destaque a este perigo no dia em que o mundo científico o parabenizava pela sua revolucionária descoberta.
Com esta mais recente pandemia (porque importa destacar que sobrevivemos já a várias pandemias, que têm o seu quê de recorrência na história), assistimos ao rápido desenvolvimento de diversas soluções para a diagnosticar, prevenir e tratar. Importa fazer o mesmo para as demais.
Não será a gripe uma pandemia? A tuberculose? As infeções causadas por bactérias multirresistentes? Também matam milhões todos os anos. E há já vários anos…
Foram os antibióticos que mudaram o nosso mundo. Mas têm ação limitada. Continuam eficazes para a maioria das infeções, mas a “era pós-antibiótica” é já anunciada há vários anos.
Celebrámos a semana passada o dia internacional do antibiótico. A Organização Mundial de Saúde considera este problema tão, tão sério que lhe dedica não um dia, mas uma semana.
Reflitamos sobre isto. E usemos com parcimónia e rigor estas preciosas mas escassas armas que temos para combater infeções que hoje nos parecem banais, mas em breve poderão deixar de o ser.
E esperemos que à ciência se dê condições, atempadas, para descobrir novos antibióticos que atuem contra estas superbactérias. A luta é constante. Renovar o armamento também deve ser.
Contudo, como diz o ditado, e bem, importa lembrar que prevenir continua a ser o melhor remédio. Mas quando a prevenção falha, é muito importante termos ainda remédio.
E assim, ao jeito dos ingleses, resta dizer “long live” os antibióticos!
Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990