Opinião
Mas qual lápis cor de pele qual quê!
Um mundo pintado com os lápis de todas as cores será sempre um mundo muito melhor e mais bonito, não é?
O professor do 1.º ciclo (antigamente professor primário) para além das aprendizagens essenciais obrigado a cumprir das diferentes áreas curriculares também tem (ou deveria ter!) uma enorme preocupação com a formação humana dos seus alunos….
Empatia, respeito, solidariedade, tolerância e liberdade são exemplos de palavras com uma forte capacidade de desenvolver a proximidade entre todos sem exceção.
Estas palavras e outras tantas que destilam livremente respeito pelos princípios básicos dos valores humanos deveriam fazer parte dos currículos obrigatórios de todas as escolas, principalmente dos ciclos de ensino onde as crianças e jovens percorrem o caminho da sua construção como Ser integrante de uma sociedade de respeito entre todos.
A natureza esforça-se por cuidar de tudo e de todos e talvez por isso ela permita ao Ser Humano nascer repleto de bondade e sem qualquer preconceito.
“- Bom dia alunas e alunos! Ontem observei uma pessoa com um ar triste e vazio a dormir na rua ao frio. Qual a vossa opinião sobre este problema?”
Podem não acreditar, mas todas as crianças se revoltam com esta situação e reagem com uma vontade imensa de resolver o problema.
“Professor podemos oferecer comida”, “…podemos trazer cobertores de casa”, “…e que tal juntarmos dinheiro e arranjar uma casa, todas as pessoas merecem uma casa para viver”.
Não podemos permitir que a sociedade destrua esta dádiva natural presente em cada um de nós e que está intrínseca na nossa génese.
Pior que tudo isto é chegar à conclusão que existe na comunidade política e também escolar pessoas que fazem parte desta desconstrução do Ser tal como ele nasce.
A poeta (e não poetisa, como a própria sublinha) Alice Neto mostrou as garras da sua revolta num poema escrito por ela e recitado na RTP África há uns dias atrás: “Olhava para o lápis, olhava para a [minha] pele / Olhava fixamente para aquele lápis cor de pele / Naquele dia desisti de falar de unicórnios e fazer citações”.
A mulher de 28 anos, nascida em 1993 na antiga freguesia lisboeta de São Sebastião da Pedreira, com a pele cor de chocolate de leite e filha de pais angolanos, falou do problema que existe numa sociedade que ainda mede a qualificação das pessoas pela cor que trazem na pele e lembrou o episódio estranho quando questionou a sua professora primária sobre o que era um lápis cor de pele e recebeu uma forte reprimenda.
Estranho mundo este que distingue as pessoas por aquilo que se vê e não por aquilo que elas são.
Devemos recusar e revoltar-nos com esta normalização de diminuir e menosprezar aqueles que estão quase sempre numa posição mais frágil.
Devemos mostrar as nossas garras do bem, que têm origem no nosso princípio de vida e dizer em alto e bom som que não aceitamos expressões como: “o lápis cor de pele”, “as pessoas de cor” e “os pretos lá do bairro”.
Devemos ser mais crianças nestes momentos e trazer de volta aquilo que a natureza nos ofereceu de mão beijada e aceitar a diferença como uma mais valia para uma melhor construção individual de cada um de nós.
Digam lá, um mundo pintado com os lápis de todas as cores será sempre um mundo muito melhor e mais bonito, não é?
Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990