Opinião

Dominar ou servir?

11 mar 2021 15:39

Corre-se o risco de, se o esquema de distribuição de verbas da proposta e, sobretudo, o seu esquema de governação não se alterarem marcadamente, os objetivos serem tão só os que estão na “órbita” do Governo que, assim, confundirá os seus interesses com os do País, como já vem sendo hábito.

Meu Caro Zé,

Na última conversa avisei que voltava ao tema da eutanásia e do abuso da representatividade dos deputados. Só que surgiu o Programa de Recuperação e Resiliência (PRR), com uma proposta colocada a contragosto em consulta pública (o prazo dado diz tudo), muito contestada por razões que eu já antevi na nossa conversa de há cerca de dois meses.

O Presidente da República, única pessoa diretamente eleita pelo povo português, veio dar-me uma “mãozinha” ao tomar uma decisão sobre o diploma da eutanásia e outra sobre a aplicação do PRR.

É que, a meu ver, há um problema de natureza política (eu direi mesmo de natureza ética) comum aos dois temas: a eventual legalidade (ou ilegitimidade) do diploma e do conteúdo da proposta do PRR, designadamente no que respeita à sua governação.

No caso do diploma, o Presidente da República não teve qualquer hesitação em enviá-lo para o Tribunal Constitucional.

Não o fez no âmbito da inviolabilidade do direito à vida, mas sim da “validação dos princípios de legalidade e tipicidade criminal”, pondo em causa o rigor da definição de “sofrimento intolerável”, bem como o alcance de “uma decisão definitiva de gravidade extrema”.

Para além das questões de responsabilização na definição e na decisão, designadamente por parte dos médicos, não se especifica se essa “gravidade extrema” é fatal, nem se é necessário que ambas as condições se têm de verificar simultaneamente.

Legislar sobre um tema muito sensível, com esta pressa e “ligeireza”, no meio de uma pandemia tão dolorosa e com tantos problemas urgentes, dá que pensar...

No caso do PRR, ao chamar a si um acompanhamento muito próximo, e desde o início, do processo de aplicação dos fundos europeus libertados para este programa, criando uma equipa de especialistas, parece querer assegurar uma aplicação que garanta os fins para que efetivamente foi criado.

É que, a meu ver, e em sintonia com tantas opiniões já emitidas, corre-se o risco de, se o esquema de distribuição de verbas da proposta e, sobretudo, o seu esquema de governação não se alterarem marcadamente, os objetivos serem tão só os que estão na “órbita” do Governo que, assim, confundirá os seus interesses com os do País, como já vem sendo hábito.

Estou a acabar de te escrever, meu caro Zé (hoje é dia 7de março) quando uma notícia de última hora me alertou para a continuidade de abuso do Governo, ao anunciar que vai autorizar cerca de 20 milhões de euros para testes rápidos de antigénio em estabelecimentos de educação e ensino público (o sublinhado é meu).

E o privado?

Obriga-se a confinar e a não lecionar online para não discriminar face ao público (que, ao contrário do que prometeu, o Governo não tinha preparado), mas agora discriminar já vale?

Há dois tipos de cidadãos?

Até Pedrógão chegará o abuso?

E a nossa paciência?

Até sempre,

Texto escrito segundo das regras do Acordo Ortográfico de 1990