Economia
'Startup' criada por docente do IPLeiria pode revolucionar comunicações sem fios
Tecnologia pode ser aplicada na exploração interplanetária, na agricultura, no comando de drones e até no lar
E se Portugal tiver uma palavra a dizer na exploração de outros planetas, na revolução e automação agrícola que se avizinha ou até no modo como interagimos com o nosso carro ou os electrodomésticos?
Quando Carlos Ribeiro, docente no Instituto Politécnico de Leiria, desenvolvia trabalho para o seu pós-doutoramento em Engenharia Electrotécnica, na Universidade de Aveiro, com o objectivo de implementar links rádio de alta velocidade para comunicação em tempo real entre máquinas para os futuros sistemas 5G, o passo seguinte pareceu-lhe óbvio: comercializar a tecnologia.
Foi assim que nasceu a TWEvo (Tactile Wireless Evolution) Lda. -. Explicar o trabalho desta startup de novas tecnologias pode ser uma tarefa complexa, mas os seus produtos têm o potencial de revolucionar o dia-a-dia de várias empresas e até de cada um de nós, no seu lar. O projecto de negócio de Carlos Ribeiro foi já premiado pela Universidade Carnegie Mellon (CMU), dos E.U.A..
Voltemos ao essencial do que faz a TWEvo. Neste momento, as soluções de comunicação wireless com drones que voam além da linha de vista, que ofereçam alto débito de dados, segurança e sem atraso, são muito limitadas.
Ou melhor, eram,” porque o agora CEO Carlos Ribeiro com o seu software Revosdr alterou o status quo. "Ao longo do doutoramento, desenvolvi várias técnicas e algoritmos avançadas para comunicações sem fios. A minha pesquisa inicial era destinada ao 4G, mas, nestes últimos anos, pareceu-me interessante adaptar esse conhecimento que adquiri no doutoramento e pós-doutoramento para criar um produto muito específico, capaz de chegar aos mercados internacionais, que são muito exigentes, em termos técnicos."
A empresa criada em Fevereiro deste ano, actualmente, conta com seis colaboradores, está sediada na incubadora de empresas do Instituto Pedro Nunes, em Coimbra, e já teve de satisfazer uma encomenda importante para uma empresa indiana, líder no mercado mundial de comunicações sem fios Bluetooth. Após quatro anos de investigação, o CEO considerou que estava na hora de concorrer ao Programa In Res, da CMU Portugal, com um projecto de negócio.
E venceu um prémio que lhe permitiu, em Outubro do ano passado, ir aos Estados Unidos dar a conhecer a sua ideia e reunir com algumas das principais empresas de comunicações do mundo, como a Samsung ou a Huawei. Após quase 30 reuniões com possíveis clientes, estava convencido de que a sua ideia de negócio tinha pés para andar.
Desde o regresso dos Estados Unidos, no último trimestre do ano passado, o processo de criação da empresa, aperfeiçoamento da tecnologia e especialmente a criação de rede de contactos estão a acontecer a uma velocidade muito grande. "Até estou um pouco surpreendido com a quantidade de contactos e a rapidez com que tudo tem sucedido", sublinha.
APLICAÇÕES PRÁTICAS DA TECNOLOGIA
Imagine-se uma empresa como a EDP, que conta com linhas de alta, baixa e média tensão espalhadas por todo o País e algumas em locais de pouca acessibilidade. Para facilitar a tarefa de examinar as linhas, são usados drones equipados com sensores.
Como modem wireless de Carlos Ribeiro, é possível, sem que o operador esteja a ver o aparelho, controlálo e receber em tempo real, tudo o que ele está a ver e tomar medidas para voltar atrás e examinar um local específico, sem o atraso que este tipo de comunicações normalmente têm.
A tecnologia também pode ser usada em agricultura inteligente para operar máquinas agrícolas robóticas em agricultura extensiva, como tractores ou ceifeiras-debulhadeiras, que percorrem enormes campos sem terem um operador humano ao volante.
Após uma reunião nos E.U.A., Carlos Ribeiro já captou o interesse de uma das principais marcas que preparam máquinas deste tipo, a Carnegie Robotics LLC, que trabalha com a John Deere, um dos maiores produtores mundiais de aparelhos agrícolas. Para já, a empresa está a estudar a aplicação agrícola do Revosdr nos mercados norte- americano e alemão. A exploração extraterrestre também poderá estar no caminho da startup.
"Uma das reuniões mais extraordinárias nos E.U.A. foi com o CEO da Astrobotics, uma das poucas empresas norte-americanas que produzem rovers utilizados na exploração de outros planetas. Nem queria acreditar no interesse dele."
A empresa está a criar veículos autónomos para serem usados na colonização de Marte. Mas o trabalho do investigador pode ser aplicado em coisas mais triviais e até em aparelhos domésticos de diversão, como uns simples óculos de realidade virtual.
Actualmente, estes sistemas têm de estar ligados por um cabo a um computador potente, para permitir a transmissão de grandes quantidades de informação para os pequenos monitores colocados à frente dos olhos do utilizador. Após o trabalho de miniaturização do sistema da TWEvo, o utilizador ficará livre para se deslocar, sem toda a parafernália atrás.
"Temos um parceiro da Samsung, a Vishare Technology, que nos contactou durante a Cebit, em Hanôver, na Alemanha, está a desenvolver soluções para o fabricante coreano, que nos está a pressionar para criarmos um produto combinado para realidade virtual", conta.
ELIMINAR O ATRASO
Os drones são complexos, pois tratam- se de máquinas robóticas extremamente intrincadas. São mais avançadas do que os helicópteros e aviões comerciais, pois têm uma grande capacidade de voo autónomo, isto é, sem intervenção do controlador humano. Contudo, a TWEvo identifiu uma lacuna no mercado e no funcionamento destes sistemas.
"A interligação sem fios tem de ser de alta velocidade, pois estes aparelhos estão equipados com um conjunto de câmaras fotográficas, de vídeo ou termográficas, lasers,e radares de alta definição", explica Carlos Ribeiro. A estação-base que comanda e controla o drone tem de estar sempre a monitorizar o comportamento e o que o aparelho "vê".
"Além da navegação, é preciso transmitir o payload, isto é, o que o grande conjunto de sensores capta, para o operador. O drone pode ter um trajecto pré-determinado, contudo, o piloto pode intervir e, assim que vir algo não conforme, fá-lo parar e examinar ao pormenor o que se passa, com transmissão de alta qualidade dos dados.
"Actualmente, a tecnologia usada comprime os dados enviados e isso atrasa a transmissão. Um atraso de um segundo ou décimas de segundo pode não parecer importante, mas é crucial em trabalhos de alto rigor. Neste momento, as comunicações usam wi-fi alterado, mas o wi-fi não foi criado para este fim. Usei o meu conhecimento da forma de funcionamento em 4 e 5G e criei uma nova tecnologia de comunicação", explica o investigador.
Sem recorrer a satélites, cujo custo de utilização é enorme, a TWEvo consegue comandar um drone além da linha de vista, a alta e baixa altitude, acima dos 300 metros e até cinco quilómetros de distância, e receber informação crítica, simultaneamente.
O FUTURO É HOJE
O desafio agora é a miniaturização e aperfeiçoamento do sistema. Para isso, a TWEvo conta com a ajuda de vários "clientes pioneiros" (early-adopters), nos E.U.A. e em Portugal, que transmitem sugestões de melhoria aos técnicos da TWEvo.
"Queremos criar um produto muito bom, perceber a quem vamos vender e só depois vamos entrar no mercado em força", explica Carlos Ribeiro. Mas, primeiro, em de identificar e apostar nos produtos economicamente mais interessantes, sem dispersar atenção nem perder oportunidades.
Num mercado tão concorrencial e com tempos de desenvolvimento tão céleres, não é possível colocar alguns projectos em banho-maria, para trabalhar noutros, sob pena de se perderem oportunidades.
Para a startup, o trabalho com drones é prioritário e irá continuar, mas a questão da realidade virtual também entra na lista de coisas a fazer no futuro. "Queremos trabalhar com a Samsung e HTC, na realidade virtual, o que nos permitirá o acesso a um mercado potencial de milhões de unidades. Contudo não podemos perder o trabalho com os drones", diz o CEO da empresa.
Trabalhar com realidade virtual implicará a criação, de raiz, de um chip. E Carlos Ribeiro não esconde o investimento que isso implica, em termos de trabalho e esforço da equipa, mas também em dinheiro. "É um custo que ultrapassa facilmente os seis dígitos... entre dois a quatro milhões de euros em investimento", resume.
No entanto, este investimento poderá ser o passo que instalará, confortavelmente, a TWEvo no mercado. " A HTC ou a Samsung, em parceria com a ViShare, vão poder retirar o cabo de ligação ao computador dos seus óculos de realidade virtual e torná-los num objecto de grande consumo", explica.
INRES
VISITA AOS E.U.A. PARA CRIAR REDE DE CONTACTOS
A Tactile Wireless Evolution (TWEvo) foi um dos quatro projectos nacionais que visitaram os Estados Unidos ao abrigo do programa Carnegie Mellon Portugal (CMU Portugal), financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia. Carlos Ribeiro (CEO) e Eduardo Castañeda participaram na terceira edição do inRes, iniciativa de aceleração de negócios da CMU Portugal.
Durante sete semanas, participaram em vários seminários, oficinas e sessões hands-on, onde os participantes tiveram a oportunidade de participar em conferências e eventos de relevo internacional.
INVESTIGAÇÃO
DA TEORIA À PRÁTICA
Investigador no Instituto de Telecomunicações, Carlos Ribeiro, o CEO da TWEvo Lda., pediu uma licença sem vencimento da Escola Superior de Tecnologia e Gestão, de Leiria, onde é docente, para prosseguir os seus trabalho de pós-doutoramento e para prosseguir o seu trabalho na startup.
"São duas entidades a quem agradeço imenso, pois, ao permitirem-me prosseguir a minha investigação, abriram-me portas com as quais jamais havia sonhado."