Desporto

Pedro Morouço: “Vemos nadadores de elite a fazerem menos metros do que alguns juvenis em Portugal”

29 jun 2017 00:00

O investigador e docente do Instituto Politécnico de Leiria foi o vencedor do conceituado prémio 'Hans Gros Emerging Researcher Award', fruto do seu trabalho na área da Biomecânica da Natação.

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Após ter vencido, em 2014, o Hans Gros New Investigator Award, no âmbito da investigação que desenvolveu em torno da performance em natação de elevado nível, foi agora galardoado com o Hans Gros Emerging Researcher Award, outro prémio atribuído pela International Society of Biomechanics in Sports (ISBS) e que distingue a pessoa que, tendo terminado o doutoramento há relativamente pouco tempo e estando numa fase de arranque da sua investigação, mais tenha elevado a Biomecânica do Desporto em termos internacionais, seja através de publicações, da disseminação dos seus resultados ou através de colaborações com outras instituições. Em que se baseia o seu trabalho?

Tem que ver com a utilização de novas tecnologias numa metodologia que já tem alguns anos, o nado amarrado, tendo como objectivo conseguir mais dados úteis para avaliar nadadores e assim poder fazer prescrição e periodização do treino. A tecnologia que desenvolvi consegue fazer um diagnóstico dos nadadores em diversos parâmetros, nomeadamente assimetrias bilaterais, assimetrias entre as partes superior e inferior do corpo e pode também avaliar uma maior ou menor predisposição para esforços de maior ou menor duração. Durante estes anos tenho colaborado com clubes, associações regionais, com a própria Federação Portuguesa de Natação (FPN) e até com parceiros internacionais. O que tenho vindo a fazer tem dado azo a processos de avaliação e prescrição que nos parecem ser bastante adequados para elevar a qualidade do treino. Prende-se com a utilização de ferramentas que sejam acessíveis aos treinadores e passíveis de dar resultados num curto espaço de tempo.

Ajuda então os treinadores a encaminharem os atletas para a especialidade correcta.

A ideia também é essa. Em conversas com um biomecânico que tem trabalhado bastante com a natação australiana - que sabemos o nível competitivo que tem - temos discutido esta lógica das assimetrias. Toda a gente assume que em nados de técnicas alternadas, como crawl ou costas, é bom haver simetria, mas a verdade é que depende da prova que está a ser nadada e até da faixa etária de que estamos a falar. Em elevados níveis de especialização e com níveis competitivos muitos elevados, assistimos a nadadores de elite capazes de obter maior impulso mecânico, e assim melhorar o rendimento, utilizando uma grande assimetria. Porquê? Com um membro superior dominante conseguem produzir uma força muito elevada, tendo o outro membro uma função sobretudo de controlo. São coisas que temos vindo a diagnosticar. Também propomos uma orientação da periodização de treino de determinado nadador, com determinado tipo de perfil, em determinada faixa etária e em determinado período da época.

Como tem sido a receptividade dos treinadores portugueses a essa intromissão?

Fui convidado para ser prelector da federação italiana, onde estive a falar para alguns dos melhores treinadores do mundo, e acredito que esse destaque tenha sido benéfico. Toda a gente lá fora diz que a investigação em natação em Portugal é muito boa. Temos grupos muito fortes pelo País e o trabalho que tem vindo a ser realizado é muito interessante, o que faz com que surjam convites fora de Portugal de entidades que querem discutir as nossas ideias. Os brasileiros, por exemplo, estão a abraçar estes projectos com muita força e querem expandir estes avanços tecnológicos. Os clubes portugueses já percebem as vantagens que podem ter ao utilizar este tipo de ferramentas de avaliação e prescrição e, portanto, há uma proximidade entre a investigação e o trabalho de terreno. Claro que ainda estamos longe do óptimo, de estes dois mundos serem um só, mas já se cruzam, o que já é muito positivo. Na FPN, a minha função é tentar levar o ensino superior e as unidades de investigação para junto dos cais e dos treinadores, que são quem mais precisa dessa investigação.

Há sempre os velhos do Restelo.

Estamos a caminhar no bom sentido, mas é necessário abrir as mentes. As pessoas devem compreender as vantagens que advêm de um maior controlo do processo de treino, porque a ideia não é mais do que fazer alguns diagnósticos pontuais, de mês a mês, por exemplo, para identificar o que deve ser trabalhado naquela altura. Se assim for, acreditamos nós, o processo de treino ficará mais orientado. Na natação estamos a caminhar para uma compreensão de que o volume é importante, mas a intensidade também, e muito. Na velha escola de treino é que se faziam volumes intermináveis. Hoje, o que vemos cada vez mais é as selecções mais competitivas interessarem-se pela intensidade e adequação das tarefas. Tem de haver a compreensão de que o volume tem de estagnar.

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