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Museus Imaginários revelam museus de Leiria pela dança
Visita dançada | Residência artística e programação performativa de Inesa Markava
A bailarina e investigadora Inesa Markava vai dinamizar a iniciativa Museus Imaginários onde explorará as relações possíveis entre a dança e o património, a memória, as exposições e os públicos em quatro espaços museológicos de Leiria.
Ao longo deste ano, a artista percorrerá o Museu de Leiria, o m|i|mo - Museu da Imagem em Movimento, o Moinho do Papel e a Banco das Artes Galeria (antigo edifício do Banco de Portugal), para criar e apresentar vários momentos, nos quais abordará a filosofia por si concebida de “visita dançada”, dentro do conceito de residência artística e programação performativa a partir dos conteúdos arquitectónicos, históricos, paisagísticos e curatoriais.
Ou seja, os espectáculos estarão ligados à génese e essência de cada dos equipamentos culturais. O projecto inicia este mês, no Museu do Moinho do Papel. "Em 2019, preparei visitas dançadas acerca do Moinho do Papel, num projecto chamado Moinho Imaginado, onde, através da dança, percorri o espaço.
Se a pandemia o permitir, espera, nos próximos dias, começar a coreografar e preparar uma apresentação que percorrerá o resto deste museu nas margens do rio Lis, onde aprofundará a interacção do meio aquático, berço de toda a vida, com as engrenagens e as rodas de moer cereal, desvendando a influência e acção transformadora do ser humano no espaço natural.
"Ao mesmo tempo, isto é revelador de como se pode criar e promover a sintonia e alguma simbiose, mesmo aplicando engenhos, entre nós e a natureza, e de como, passo a passo, perdemos isso e nos colocámos acima da natureza", explica.
Após a incursão pelas margens ribeirinhas, Inesa subirá à cerca do castelo de Leiria, e ao m|i|mo. Aí, explorará uma visita dançada com reflexo no "movi- mento", que dá nome ao espaço, levando-a pela Oficina do Olhar ou pela zona de exposições temporárias.
"Tudo nascerá ali, a partir do diálogo com o espaço. Não vou levar nenhuma ideia pré-feita. Vou começar do zero, em diálogo com o espaço. No fundo, é uma ideia de site specific que acrescenta outros componentes, como a preocupação com a natureza ou a história e os segredos do espaço."
Já na BAG, a bailarina explica que a dinâmica será diferente, por ser um local onde as exposições mudam com maior frequência e, por isso, terá a oportunidade de se alongar nas quatro mostras que estão programadas para 2021. A primeira deverá ser Paraíso, exposição conjunta de Hirondino Pedro e Sílvia Patrício. Tudo conspirará, espera, para que, no Verão, estreie a Performance Rosa de Fronteira, no Jardim Luís de Camões, numa lógica de actividades do Banco das Artes Galeria fora de portas.
O último equipamento cultural a ser coreografado e com o qual Inesa Markava encetará um diálogo será o Museu de Leiria, no final do ano. Aí, irá trabalhar sobre a exposição de longa duração de pintura e debruçar-se-á sobre as telas com motivos religiosos, entre as quais se destacam as representações da Natividade e do Cristo Jesus.
"Como será perto da época natalícia, pensei em dar-lhe o nome de Advento, ou algo ligado ao universo da maternidade." A proposta de performance chamar-se-á Exposição dançada: Advento com Museu de Leiria. A bailarina admite que gostaria de internacionalizar o projecto em breve. Arte e espaço O projecto Museus Imaginários vai consolidar algum do trabalho que desde 2011 tem aprofundado.
“Tudo começou quando, no âmbito de mestrado, fiz um estágio curricular no m|i|mo - Museu da Arte em Movimento, em Leiria, e tive o meu primeiro contacto com os museus e com a experiência de ligar dança ao espaço arquitectónico.” Quando, em 2016, regressou aos estudos, dessa vez para doutoramento, escolheu aprofundar o tema.
"Dança e património, dança e arquitectura, dança com as artes. Como a dança é uma arte que está ligada ao espaço, parece-me importante estudar a arquitectura do espaço, mesmo quando o objectivo é coreografar uma exposição. Há sempre vários tipos de conteúdo a explorar quando preparo uma visita ou exposição dançadas. O objectivo é filtrar a informação sobre a mostra e sobre o artista, pelo corpo, pelas emoções, pela inteligência emocional e transcrevê-la em passos de dança e interacção."
Na museologia moderna, é importante deixar um espaço para o público e Inesa planeia momentos de abertura aos espectadores. "Faço convites através da utilização de materiais ou de abordagens coreográficas, mas, muitas vezes, nasce tudo da interacção com as pessoas."
E isto é importante porque os museus, na actualidade, deixaram de ser meros locais expositivos e passaram a ser espaços de interacção e partilha, onde o público tem liberdade para experimentar e onde a sua experiência intrínseca também conta.
"Há museus que traçam as novas exposições com pequenos grupos de reflexão, os chamados grupos de curadoria. Dá-se a oportunidade de dar um contributo a quem está de fora."
Inesa vê no seu projecto também esse potencial de mediação e de contacto com outro tipo de linguagem, de outro tipo de inteligência e da relação entre a natureza e o meio, seja construído ou não.