Saúde

Equipa dos paliativos pediátricos de Leiria são "deuses que estão ali"

2 jun 2024 08:30

Valência do Hospital de Santo André já acompanhou 45 crianças em cinco anos

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Ricardo Graça/Arquivo

“Tenho uma família que não vive em minha casa. Com aquela equipa sinto-me protegida e acolhida e sei que se o meu filho tiver algum problema de saúde repentino posso ligar e tenho resposta. Não cuidam só do Lúcio, mas também há uma preocupação comigo.” Este é o sentimento demonstrado por Judite Mussica, mãe de uma criança com paralisia cerebral e lúpus, que tem sido acompanhada pela Equipa Intra-Hospitalar de Suporte em Cuidados Paliativos Pediátricos do Hospital de Santo André, em Leiria, que está a comemorar cinco anos de trabalho.

Desde que abriu portas, esta valência já acompanhou 45 crianças e respectivas famílias. Destas, sete atingiram a maioridade e passaram para o serviço de adultos, duas tiveram alta e dez morreram. Neste momento, são seguidos 26 menores com doença crónica complexa.

Não estão em exclusivo e dedicam muito mais tempo para além daquilo que está estipulado. A equipa constituída por uma médica, quatro enfermeiras, uma técnica de serviço social e uma psicóloga clínica tem como meta promover a melhoria da qualidade de vida dos doentes, acompanhando os doentes ao nível intermédio.
“Temos cerca de 280 crianças na nossa área de influência com todo o tipo de patologia neurológica, oncologia, doenças cardíaca ou metabólica. As principais são as neurológicas relacionadas com paralisias cerebrais”, explica Margarida Henriques, coordenadora da equipa.

A especialista em neuropediatria adianta que os cuidados paliativos pediátricos intervêm ao nível dos cuidados generalistas, mas todos os profissionais têm formação específica. “Quando estive internada com o meu filho, uma enfermeira ofereceu-se para dormir com o Lúcio para que eu pudesse sair do hospital. São deuses que estão ali”, constata Judite Mussica.

Margarida Henriques salienta que “há uma partilha e um trabalho de proximidade e em rede entre o hospital de Leiria e o Pediátrico de Coimbra”, sendo que dois hospitais partilham “alguns doentes, que mantêm o acompanhamento próximo pelas duas equipas”.

“Se os doentes se encontrarem numa situação de maior complexidade e carecerem de cuidados especializados, a articulação entre equipas é ativada, tentando minimizar ao máximo o impacto da agudização na vida da criança e da sua família”, sublinha a especialista, ao garantir que a “mais-valia desta valência é a proximidade e a relação que é estabelecida com as famílias, evitando-se idas às urgências”.

A equipa está sempre disponível para falar ao telefone ou por e-mail, tira dúvidas, o que contribui para a criação de “uma relação de confiança”.

“Esta proximidade não existe só nos momentos de agudização do doente”, mas sempre que as famílias necessitam de algo. “É uma via verde que as pode encaminhar.”

Nascida em Janeiro, a filha de Silvana morreu em Abril. Sofria de trissomia 18. A mãe tinha consciência que o tempo de vida seria curto, mas dedicou-se à criança, situação que encontrou também em toda a equipa. “São pessoas muito dedicadas. Só tenho de agradecer a toda a equipa o cuidado, o acompanhamento, o carinho e tudo o que fez pela minha filha, por mim e pelo pai. Sempre que precisei, estavam lá. O trabalho que fazem é muito bonito”, revela, garantindo que depois da morte da filha foi de imediato disponibilizado apoio psicológico.

A responsável pela enfermagem, Margarida Marques, desmentiu “que os cuidados paliativos sejam o fim de linha”, até porque haver altas. “Temos tentado desmistificar esse mito junto dos profissionais de saúde e a referenciação tem aumentado.”

A assistente social Adriana Azevedo realça que a equipa “multidisciplinar que trabalha de forma interdisciplinar”, onde “todos fazem parte da solução, incluindo a família”.

As doenças que se chegam aos cuidados paliativos pediátricos de Leiria não têm cura, mas o tempo de vida varia de caso para caso. “As crianças são muito imprevisíveis”, reconhece Regina Silva, enfermeira na Unidade de Cuidados Especiais Pediátricos, ao admitir não existir uma fórmula mágica para lidar com a morte de uma criança. No entanto, a equipa tenta preparar a família e ajudá-la a despedir-se quando a morte parece estar próxima.

O envolvimento deste grupo de profissionais não termina com o fim da vida da criança. A família é acompanhada no seu luto, além do protocolo habitual. “Há famílias que passados vários anos ainda nos visitam”, revelam.