Sociedade

Devia ser zona limpa, mas recebeu uma plantação de sobreiros. O estranho caso do aceiro exterior no Pinhal de Leiria, que é invadido por um campo de futebol

16 out 2020 11:20

Membro do Observatório do Pinhal do Rei denunciou a situação. Presidente do ICNF admite erro e garante que será corrigido

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Os sobreiros plantados no aceiro exterior do Pinhal de Leiria, na zona da Garcia
Cláudio Garcia

O aceiro exterior do Pinhal de Leiria é uma faixa que visa travar a progressão das chamas.

Oficialmente, no papel, tem 22 metros de largura.

Existe a nascente e a sul, já que a norte a Mata Nacional de Leiria faz fronteira com o rio Lis e a poente está o mar.

Segundo José Nunes André, geógrafo e membro do Observatório do Pinhal do Rei, o aceiro exterior existe desde o tempo do Marquês de Pombal e foi aberto para proteger a propriedade pública de eventuais incêndios com origem nas florestas privadas em redor.

“Para desempenhar o seu objectivo, tinha de estar sempre limpo”, nota José Nunes André, que se mostra incrédulo com os sobreiros plantados recentemente no interior do aceiro exterior, na zona da Garcia.

Isso mesmo denunciou ontem à tarde numa sessão do Observatório do Pinhal do Rei, com o presidente do ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, que gere a Mata Nacional de Leiria, a confirmar a situação.

“Foram plantados no aceiro, inviabilizando a função dele”, sublinha José Nunes André, em declarações ao JORNAL DE LEIRIA.

Uma das árvores colocadas no aceiro exterior da Mata Nacional de Leiria

Nuno Banza fala de “uma área muito pequena que não chega a mil metros quadrados”.

“A área referida que foi arborizada no aceiro é uma área que neste momento não chega a mil metros quadrados”, reforça o presidente do ICNF.

Foi um erro dos serviços ter permitido que aquela pequena área tivesse sido arborizada”, admite. “Foi arborizada com árvores muito pequenas e será naturalmente corrigido esse erro”.

Baliza no Pinhal

Mas há mais.

A cerca de um quilómetro, existe um campo de futebol, murado, que segundo José Nunes André invade o aceiro exterior.

“Está construído, parte dele, dentro do aceiro”, descreve o geógrafo, para quem o caso “revela desleixo” na gestão da Mata Nacional pelo Estado.

O marco com a inscrição MN de Mata Nacional é visível e o complexo desportivo prolonga-se alguns metros para nascente dentro do território que é propriedade do Estado.

O marco da Mata Nacional de Leiria, à direita na imagem, mostra que o campo invade a propriedade do Estado

Nuno Banza confirma-o.

“Temos consciência que houve ocupações do aceiro que são ocupações que nos extravasam e até ocupações fora da esfera do âmbito do próprio Instituto, no caso uma operação urbanística”, disse na reunião do Observatório do Pinhal do Rei.

“Naturalmente, seguramente com o apoio da Câmara Municipal da Marinha Grande, será reposta a legalidade, caso seja necessário, e nós restabeleceremos o aceiro exterior da Mata”, garantiu o presidente do ICNF.

Balanço e investimentos

O incêndio de Outubro de 2017, fez ontem três anos, atingiu 86% do Pinhal de Leiria. Arderam 9.500 hectares.

Na sessão de ontem, com o secretário de Estado das Florestas, João Catarino, foi feito o ponto de situação e apresentados investimentos para os próximos anos.

A regeneração natural encontra-se aquém do esperado e há 2.000 hectares que, afinal, terão de ser rearborizados.

Até 2024, está previsto rearborizar pelo menos 4.700 hectares de área ardida e só estão rearborizados 1.178 hectares (com uma taxa de sucesso de 80%, isto é, 20% das plantas morreram).

No restante, o Estado continua a contar com regeneração natural.

Contas feitas, estão executados ou aprovados para executar, um total de 4,3 milhões de euros.

E há 4,8 milhões para executar entre 2021 e 2024.

Ou seja, o Estado compromete-se a investir 9,1 milhões de euros até 2024 no Pinhal de Leiria.

As acções de rearborização e de aproveitamento da regeneração natural representam dois terços deste valor.

A venda de madeira ardida com interesse comercial proveniente dos incêndios de Outubro de 2017 no Pinhal de Leiria está 99% concluída e rendeu 16 milhões de euros.

João Catarino garante que o dinheiro será totalmente reinvestido na Mata Nacional de Leiria. E diz que não chega. Serão necessários mais milhões e mais investimentos além de 2025.