Entrevista

António Poças, presidente da Associação Empresarial da Região de Leiria (Nerlei CCI): “Não podemos ficar parados, à espera que as coisas aconteçam”

21 nov 2024 08:00

O responsável termina agora o segundo de dois mandatos, com um balanço do trabalho da sua equipa. Afirma que os agentes da região têm de se unir e apostar mais na economia digital, com um plano a médio prazo

António Poças
Fotografia: Ricardo Graça
Jacinto Silva Duro

Nos seis anos à frente da direcção da Nerlei CCI, teve de enfrentar crises políticas, uma pandemia, alterações geopolíticas. No panorama empresarial, quais foram as principais dificuldades que enfrentou?
Antes de ser presidente, já tinha assumido funções, durante alguns anos, na mesa da Assembleia Geral e como membro de uma direcção. As empresas hoje estão mais capazes. Aprenderam e estão mais preparadas em várias áreas. É o caso do digital, que a pandemia acelerou imenso, e as questões ambiental e social. Acima de tudo, as empresas estão mais exportadoras e estão mais bem organizadas, mais preparadas e têm produtos melhores. Isto também tem, obrigatoriamente, a ver com as pessoas. Segundo estudos da Universidade Nova e da União Europeia, as empresas portuguesas têm um défice de gestão. Se compararmos a nossa gestão, com a norte-americana… toda a Europa tem um défice em relação aos Estados Unidos. Mesmo assim, os quadros intermédios das nossas empresas estão melhores e a gestão está a reforçar-se também. Estou firmemente convencido de que as empresas têm melhores processos e visões do mundo, dos negócios e do futuro e estão mais preparadas do que há seis anos. Fizeram esse trabalho, por razões menos boas, como a pandemia ou por outras crises que estão a obrigar as empresas a reinventar-se. Temos um défice tecnológico na Europa comparativamente com os EUA… Se calhar na área farmacêutica, temos empresas de topo, mas se virmos o digital, das dez maiores empresas americanas oito são tecnológicas. Entre as dez maiores europeias, há apenas duas tecnológicas e estão em 7.º ou 8.º lugares na tabela. Na nossa região, o índice de exportações em alta tecnologia é metade do de Aveiro, Braga ou Coimbra.

Quais foram, para si, os marcos mais importantes nestes dois mandatos?
Muito daquilo que a Nerlei faz, deve-se aos seus colaboradores e direcção e gostaria de agradecer todo o apoio que me deram enquanto estive na presidência. Quanto aos marcos, houve a escolha do novo director-executivo. A direcção da Nerlei é não executiva e não está lá todos os dias. Quem está é a equipa e o Henrique Carvalho agarrou o difícil desafio de substituir a Neuza Magalhães, pessoa de muita experiência. Outro marco foi a criação do Gabinete Económico Social em consequência da pandemia. Foi um trabalho muito positivo de Jorge Santos e muitas das ideias sugeridas eram de médio prazo. Uma delas foi que a CIMRL tivesse uma intervenção maior. Não fomos nós a alterar isso, mas, hoje, temos uma óptima relação com a CIMRL e com o seu director-executivo, que está a fazer um excelente trabalho. Não tivemos influência na sua escolha, mas falámos com os dez presidentes de câmara da CIMRL e todos concordaram com a nossa sugestão. Outra etapa importante, foi a criação do fundo de investimento que está a arrancar e que queremos, com a CIM, transformar num instrumento regional mais vasto, sob a forma de agência de atracção de investimento. Vivemos numa região privilegiada a nível empresarial. As nossas empresas são dinâmicas, resilientes, inovadoras. Temos uma grande ligação com vários parceiros institucionais como o Politécnico, mas também com a Acilis, a APIP, a Cefamol ou a Aricop.

Sendo um homem da tecnologia e da economia digital, e comparando a nossa região com o que está a acontecer em Aveiro ou Braga, acredita ser possível captar investimento do digital, como foi tão falado em anos recentes?
Claramente que pode acontecer, porque a economia digital tem a vantagem de os saltos serem mais rápidos. É preciso tomar medidas mais agressivas no digital e ver o que é que essas cidades fizeram. Este é um problema nacional e europeu. A Europa não tem só de se reindustrializar, como a pandemia provou. Tem de ter uma aposta muito clara no mundo do IT e da Inteligência Artificial (IA). A Europa não conseguiu acompanhar a dinâmica americana, mas não há razão para não o fazemos na IA. Entretanto, por exemplo, vão surgir os computadores quânticos e esta seria uma boa área de aposta para a Europa. É claro que Leiria pode ter grande sucesso no digital. A economia está a terceirizar-se e a digitalizar-se e Leiria é uma região de indústria, mas isso não quer dizer que não possa ser de investimento na tecnologia. Veja-se o que o Fundão está a fazer nesta área. A Câmara do Fundão esteve no Web Summit a captar startups para irem para lá. O pró-reitor da Universidade de Coimbra para a transferência de tecnologia contou-me que tem sete comerciais, gestores seniores de empresas, que andam pelo mundo inteiro a captar empresas e projectos de pesquisa para serem realizados na universidade. É assim que se faz. Não podemos ficar parados, à espera que as coisas aconteçam. Se o Paulo Fernandes, autarca do Fundão, ficasse à espera, não tinha acontecido nada. Teve uma ideia e pôs-se ao caminho. O Fundão é, verdadeiramente, uma cidade do interior, com um projecto de médio prazo fantástico. Nesta questão, vai ganhar mais quem andar para a frente, quem tiver a percepção de que defender a economia digital não é desvalorizar a indústria, mas potenciá-la, pois ela é, hoje, extremamente digital.

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