Opinião
Regiões sem o ser?
Dentro do verbo com a palavra “regionalizar” devia caber a melhoria das decisões que nos afectam e soluções imediatas e concretas para vilas e cidades por este País fora
A linguagem técnica e encriptada da forma como o Estado se organiza para distribuir fundos comunitários, impede o comum dos mortais de perceber o que se passa no território onde se insere. A menos que precise, ou queira, recorrer a fundos comunitários, mas nesse caso terá que recorrer a uma consultora (ou afins) para decifrar burocracia. Isto na ponta final do pipeline.
A montante temos o mesmo tecnicalismo de estruturas (as CIM´s) que poucos percebem. É inquestionável o seu papel, digo isto com a certeza e sinceridade de elogiar o trabalho de muitas destas organizações e a sua contribuição decisiva na distribuição de fundos comunitários nas regiões fora de Lisboa e Porto.
Chamam-lhes unidades estatísticas (lá está a semântica a funcionar…) e são elas, por exemplo, que têm uma fatia substancial do PRR para executar. A sua organização tem contribuído para retirar muitas das decisões de Lisboa, como também o reforço de poderes das CCDR (outra sigla que diz pouco a muitos cidadãos), que em larga medida começou a estender para fora das grandes cidades as oportunidades de financiamento.
As “regiões” (os seus autarcas, entenda-se) sempre reclamaram mais e melhor aplicação de fundos pelo território. Gritar pela regionalização tem sido, acho eu, uma das formas que entendem para dar resposta a esse esbater de diferenças. Dentro do verbo com a palavra “regionalizar” devia caber a melhoria das decisões que nos afectam e soluções imediatas (o tempo nestas decisões é infinito…) e concretas para vilas e cidades por este País fora.
Olho para esta região natural entre Leiria e Fátima e vejo-a cheia de fronteiras e barreiras administrativas. Ao contrário da vida das pessoas, que não se organiza dessa forma, pelo contrário.
Saindo de Fátima e rumando a Leiria, (sem autoestradas), podemos fazer um contínuo urbano: Fátima, Loureira, Santa Catarina da Serra, Pedrome, Vale Sumo, Cardosos, Freiria, Touria, Pousos, Leiria... – limito-me a referir alguns pontos para melhor identificação. É por aqui que se organiza a vida de milhares de pessoas e famílias, entre empresas e os seus trajectos “naturais”.
O mesmo não acontece quando nos referimos às estruturas que nos organizam a vida “estatística”, que é diferente daquela em que vivemos na realidade. Por exemplo, na educação ou na saúde (porque dependem do Estado), fazemos parte de regiões diferentes. Até parece um Metaverso qualquer isto de ter vida estatística…
O parlamento aprovou no final do ano 2022, uma resolução a pedir ao Governo a criação de uma NUT II para a Lezíria do Tejo, Médio Tejo e região Oeste. Mais uma vez, para a esmagadora maioria das pessoas estas siglas nada revelam, mas esta resolução “sugere” ao Governo, outra forma de organizar a região que conduz a uma aplicação de fundos comunitários diferente daquela que tínhamos até aqui entre o distrito de Santarém e a região Oeste de Leiria.
São mudanças à la long nas nossas vidas… Num trocadilho de palavras, estamos no fundo a regionalizar de forma diferente. Fará sentido? Estará esta realidade estatística mais comprometida com a vida real das pessoas, das suas necessidades reais e da sua organização natural? Mais de 3 décadas de intensa aplicação de fundos comunitários tornaram o País melhor, mas com muito menos coesão social e territorial. Era bom que isto fosse para ser mesmo a sério desta vez…