Opinião

Por humanismo ou por egoísmo: pouco importa...

10 mar 2016 00:00

Ao contrário do que muitos pensariam, havia uma rede de associações de cariz social que emergiu na fase mais crítica, amparando inúmeras pessoas de quedas mais acentuadas com, pelo menos, comida, tecto e algum afecto.

Poucos terão dúvidas de que a grave crise económico-financeira que assolou Portugal nos últimos anos poderia ter tido consequências sociais muitíssimo mais dramáticas. Apesar de tudo, das enormes dificuldades por que têm passado muitas famílias, das condições desesperantes em que alguns se viram cair, das inúmeras vidas pouco dignas, a verdade é que houve capacidade na sociedade portuguesa para acudir aos mais necessitados com os mínimos que a vida exige para a sobrevivência.

Ao contrário do que muitos pensariam, havia uma rede de associações de cariz social que emergiu na fase mais crítica, amparando inúmeras pessoas de quedas mais acentuadas com, pelo menos, comida, tecto e algum afecto. Não o suficiente para se chamar vida à vida, mas o fundamental para evitar situações mais desesperantes e, apesar de tudo, para conseguir manter alguma serenidade social. As instituições ligadas à Igreja têm tido um papel determinante, mas a essas juntam-se muitas associações e movimentos civis que têm desenvolvido um trabalho hercúleo e de grande generosidade. Geralmente suportadas por voluntários e dadores anónimos que, em alguns casos, vivendo eles também com algumas dificuldades, acabam por partilhar o pouco que têm.

No entanto, apesar da resposta positiva que houve, os recursos ao dispor destas instituições são manifestamente escassos, principalmente se atendermos à importância do trabalho que desenvolvem, quer na vertente da dignidade humana, quer na própria estabilidade social do País.

Ou seja, fazem muito com pouco, às vezes verdadeiros milagres só possíveis com muita disponibilidade pessoal e com uma generosidade imensa. A maioria das pessoas nem imagina a diferença que poderia haver se essa disponibilidade e generosidade fosse alargada. Se fossem mais a contribuir, mesmo que com pouco, quer com trabalho quer com bens ou dinheiro.

Quem tiver a oportunidade de visitar alguns dos locais onde é desenvolvido esse apoio aos mais fragilizados e carenciados, de que damos três exemplos nesta edição, ficará surpreendido como o seu pequeno contributo poderia ser importante. Como o sofá ou o tapete esquecidos na garagem ganhariam ali nova vida e aumentariam o conforto. Como a máquina de lavar roupa fora de uso seria uma ajuda preciosa. Como os 200 euros que se gastam em duas ou três peças de roupa, que se usarão meias dúzia de vezes, permitiriam fazer tantas refeições. Muitos nem pensarão nisso, por desconhecimento, distração ou insensibilidade. Outros, por egoísmo, não querem saber.

A verdade, no entanto, é que é uma questão que deveria merecer a atenção de todos, empresas incluídas. Neste caso, até pela responsabilidade social que têm para com a comunidade. Se não for pelo humanismo, pelo menos que se contribua pela inteligência de reconhecer que uma convulsão social provocada pelo desespero seria penalizadora para todos. Se não for pelos outros, que seja pelo egoísmo de se querer continuar a viver num País seguro e sem grandes tumultos.