Opinião
Património cultural imaterial é agora
As tradições e vivências de agora são património cultural imaterial deste presente momento em que estamos
Constantemente, principalmente no âmbito etnográfico, falamos de tradições, usos e costumes como se fossem um património cultural imaterial cristalizado num passado recôndito. Proferimos a sua ancestralidade como se fosse um património a colocar numa prateleira para se dar a conhecer aos mais novos e a gerações futuras.
O património cultural imaterial é transversal e deve ser preservado quando inativo na coexistência de uma determinada sociedade, e deve-lhe ser dada continuidade se for elemento diferenciador de um grupo social, com as respetivas adaptações que cada comunidade lhe introduziu com base na sua habitabilidade social, cultural e económica.
Não podemos interpretar o património cultural imaterial como algo do passado, nem devemos impor que a sua intangibilidade permaneça nos hábitos sociais da atualidade. O património cultural imaterial é o presente e no futuro será recordado, ou não, como os usos, os costumes e as tradições de um determinado grupo social que viveu numa delimitada época.
Os valores sociais, corretos ou não, dependendo da opinião e conceito de cada um, foram transformáveis ao longo dos tempos e no presente essa transmutação continua a acontecer e terá consequência no futuro com toda a criação contemporânea. As tradições e vivências de agora são património cultural imaterial deste presente momento em que estamos.
Devemos apagar o património imaterial do passado? Nunca. Devemos viver como no passado? Nunca. Devemos preservar o passado? Sempre. Preservar não é praticar, não é fazer igual na vida quotidiana. Preservar é ensinar o presente como devemos projetar o futuro. Viver é praticar o património cultural imaterial com a vicissitude que o presente nos dá.
Devemos respeitar, proteger, preservar e defender a memória, sendo um dos trilhos para a nossa história, mas devemos continuar o nosso caminho sem estarmos colados ao passado, envolvendo a memória histórica e a criação contemporânea, como defende Guilherme d’Oliveira Martins no seu “Património Cultural – realidade viva”.