Opinião

O que estou aqui a fazer?

5 dez 2025 11:22

Apesar das falhas do sistema, acredito profundamente no poder das pessoas e no impacto que podemos gerar, mesmo quando o caminho parece desesperadamente lento

Em novembro estive no Brasil, na COP30 — a 30.ª Conferência das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas, e a minha terceira experiência na ONU. A primeira conferência das Nações Unidas tem sempre um sabor especial: o crachá ao peito, o estatuto das delegações, a sensação de que fazemos parte da solução... Mas não demora muito até que esse romantismo se desfaça e surja a pergunta que acompanha muitos ativistas nos corredores: “O que estou aqui a fazer?”

Estar nestes espaços é um privilégio. Então porquê eu? Não por dúvidas sobre as minhas capacidades (talvez também), mas porque sei que existem pessoas que mereciam ainda mais esta oportunidade. Comunidades marginalizadas, povos indígenas, jovens de territórios vulneráveis, líderes comunitários que já sentem na pele, com grande intensidade, os impactos da crise climática. Pessoas para quem participar numa COP não é apenas representação, mas uma questão de sobrevivência e justiça.

Por outro lado, que diferença faz a nossa presença? E que diferença fazem estas conferências? O multilateralismo é lento e frustrante, e a COP30 não foi diferente. Esta era a “COP da Implementação”, mas nos textos finais não se menciona a transição dos combustíveis fósseis. Era a “COP da Amazónia”, mas, mais uma vez, ficámos com declarações vagas e metas pouco ambiciosas, muito longe da urgência científica e das necessidades das comunidades.

Existe ainda o estigma sobre a participação de ativistas, sobretudo jovens. Vamos ser claros: eu não vou à COP para passear. Estas conferências são uma montanha-russa emocional, com milhares de eventos em duas semanas exaustivas. Come-se pouco, dorme-se ainda menos, os custos são exorbitantes e o desgaste psicológico é real, sobretudo para a sociedade civil e juventude, que tantas vezes estão à margem das negociações formais e lutam para ocupar o espaço que lhes continua a ser negado.

Então, o que estou aqui a fazer? Ou melhor, porque é que continuo? Pelas pessoas. Pela juventude, cuja presença é essencial para assegurar um futuro sustentável e justo. Continuo para conhecer pessoas e projetos que transformam as suas comunidades e merecem ser amplificados num palco internacional. Para criar sinergias, construir mudança e usar a comunicação para democratizar estas conferências e dar plataforma a quem mais precisa de ser ouvido. Porque, apesar das falhas do sistema, acredito profundamente no poder das pessoas e no impacto que podemos gerar, mesmo quando o caminho parece desesperadamente lento.

Texto escrito segundo as regras do Novo Acordo Ortográfico de 1990