Opinião
O muito e o pouco
Sem voltar à pobreza, como voltamos do muito ao pouco?
Saíram vários artigos muito interessantes na imprensa, nesta semana que passou, inquietantes ao ponto de merecerem uma reflexão atenta.
A vida inteira com o salário mínimo, que saiu no Público, foi um deles. E o outro tema foi a COP 26, a cimeira do clima, que merece reflexão não necessariamente pelas suas brilhantes conclusões. Um artigo a assinalar foi escrito por Jeremy Clarkson no Sunday Times: “If Greta and her pals really want to get results…”
O primeiro artigo diz-nos que em Portugal, em 2001, 4% das pessoas recebiam o salário mínimo. Este ano são cerca de 23%.
A estagnação do salário médio acompanha esta realidade, pois paulatinamente tem vido a acompanhar os valores dos mínimos. A consequência está à vista.
Continuamos com uma máquina de despesa pública onde não há dinheiro que vede esse buraco, constituindo um enorme sorvedouro das parcas contribuições de um país economicamente frágil e pobre.
A escalada dos preços dos combustíveis em cima destas vidas constitui a perda dos poucos graus de liberdade que ainda restavam.
A COP 26 diz-nos que tem que ser. Sabemos bem os efeitos no planeta do aumento do número de emissões CO2, da poluição, da extinção de espécies, da percentagem de recursos hídricos poluídos, das imagens dos plásticos nos oceanos e toda a vida marinha and so on.
Por cá, na Europa, continuamos a culpabilizar-nos, e bem, pelos maus comportamentos que temos nesta matéria enquanto sociedade.
Lá vamos legislando contra as palhinhas e os cotonetes, os plásticos na mercearia e vamos pagando a carga fiscal que isso acarreta. Tudo em nome do clima e um planeta mais limpo.
No outro artigo acima referido, Jeremy dá nome e voz às inquietações que temos quando ouvimos a pequena Greta aos berros na cimeira, ao dizer que aquilo tudo não passa de blá blá blá dos governantes.
Ela tem razão porque se faz pouco, mas chateia a forma de vida que conhecemos, esmagada de impostos para pagar todos estes desideratos… e nunca chega.
Mas gostaríamos também todos de ver a pequena sueca em locais da China à India, os maiores poluidores mundiais, manifestando-se com a mesma veemência e a ter a mesma cobertura de imprensa “livre”.
Qualquer viagem a um desses destinos deixa-nos arrepiados com o que se vê por lá acontecer e não parece ter fim à vista.
Somos excessivamente tolerantes com a pobreza e excessivamente lentos a reagir a tudo o que precisa de ser mudado, talvez por isso tenhamos que levar tudo como imposição.
Erradicar a pobreza é repensar modelos económicos e novas formas de redistribuição. Infelizmente a pobreza não é só material e económica.
Vivemos em tempos de abundância, não podemos dizer o contrário. Temos uma sociedade de bem-estar, onde a prosperidade só assenta em crescimento e consumo.
Nasci e cresci numa família e num tempo onde a frugalidade era uma obrigação, mas também uma consciência. Não havia fast fashion. New Tech durava a vida inteira. Portugal era um país pobre.
Mas o planeta estava muito mais limpo. Sem voltar à pobreza, como voltamos do muito ao pouco?
Neste momento a discussão é crítica, porque para sermos generosos temos que prescindir do que temos, sobretudo penalizando parcas economias familiares em nome de virtudes planetárias.