Opinião

Música | Emahoy Tsegué-Maryam Guèbrou

17 jan 2025 08:52

Desenvolveu uma forma de compor absolutamente única, que cruza géneros e escalas como se do piano fizesse um mapa mundo

Yewubdar Guèbrou nasceu no final de 1923 na capital da Etiópia, no seio de uma família abastada e, com apenas seis anos de idade, foi, com a sua irmã, estudar para Basel, na Suíça, tendo sido, ainda em tenra idade, provavelmente, das primeiras mulheres etíopes a a receberem formação escolar e musical no estrangeiro, regressando depois ao país natal para o ensino secundário.

Nesses anos, a Itália de Mussolini invadiu a Etiópia, viu elementos da sua família serem mortos e seguiu com os restantes como prisioneira de guerra para ilhas italianas. No fim do conflito voltou ao seu país, decidida a afirmar a sua carreira e desafiando uma sociedade patriarcal, torna-se presença habitual em apresentações no palácio e a primeira mulher a trabalhar no ministério dos negócios estrangeiros da Etiópia.

Um par de anos depois volta a sair para estudar música no Cairo, onde conhece o violinista Alexander Kontorowicz, que depois acaba por ser contratado pelo imperador etíope e a leva de volta com ele. Aos 21 anos tem a oportunidade da sua vida para poder ingressar na Royal Academy Of Music e, ao ser travada pelo regime, decide que a música acabou e refugia-se num mosteiro, acabando por receber o título de Emahoy seguido do nome religioso Tsegué-Maryam.

Com um largo conhecimento das tradições musicais etíopes, aulas clássicas de violino e de piano desde nova, vivendo o despoletar do movimento jazzístico e dedicando grande parte da sua vida à espiritualidade e religiosidade, Emahoy Tsegué-Maryan Guèbrou foi, aos poucos, voltando ao piano e desenvolveu uma forma de compor absolutamente única, que cruza géneros e escalas como se do piano fizesse um mapa mundo.

Apesar de um regime ditatorial e de uma reclusão não terem permitido ao grande público, ao longo de décadas, acompanhar as suas criações, na fase final da sua vida, quando já está em Jerusalém, já nos anos 2000, são finalmente lançadas a nível global algumas das suas gravações e faz ainda algumas apresentações ao vivo e cria uma fundação com o seu nome para fomentar o ensino e a prática musical a crianças desfavorecidas.

Em 2017 Kate Molleson vai a Jerusalém conversar com Emahoy Tsegué-Maryam Guèbrou que, aos 93 anos, nos guia na deliciosa peça “The Honky Tonk Nun”.

Um pequeno milagre e música para os nossos ouvidos.