Opinião
Momentos históricos
Para a História ficam os momentos que condicionam a vida coletiva
A História é a memória coletiva dos povos e da Humanidade, existente desde que se conseguiu deixar os legados para o futuro após a invenção da escrita.
É, na verdade, um processo evolutivo de construção e reconstrução.
Um determinado evento relevante é estudado, debatido e procura compreender-se os seus motivos, as suas consequências, os méritos e responsabilidades de cada ator.
A interpretação histórica que se faz dos eventos permite criar identidade de um povo, inventar inimigos, fabricar motivos de invasões e guerras, justificar atos hediondos.
É de tal forma importante que George Orwell escreveu, a propósito do mundo distópico que imaginou no livro 1984: “Quem controla o passado, controla o futuro. Quem controla o presente, controla o passado.”
Afinal, cada vez que a Eurásia fazia a paz com a Oceânia e declarava guerra à Lestásia (e vice-versa) os trabalhadores do Ministério da Verdade tratavam de reescrever livros, jornais e toda a História, para que a realidade do momento fosse, aparentemente, a que sempre existiu.
Nos cerca de 6000 anos de escrita que a Humanidade já leva, muitos são os momentos vividos por cada um dos cerca de 100 mil milhões de seres humanos que já pisaram a Terra.
Nem todos ficaram para a História. Pela sua banalidade, insignificância, desconhecimento, ou esquecimento.
Para a História ficam os momentos que condicionam a vida coletiva: conflitos políticos e militares, invasões e ocupações, colonizações e genocídios, alianças entre países e líderes, crises políticas e económicas, epidemias, fomes, celebrações coletivas.
Por vezes, as pessoas que vivem um momento histórico não se apercebem: é pouco provável que um anónimo chinês com sacos de supermercado a atravessar a Praça de Tiananmen, ou três crianças dedicadas à pastorícia no concelho de Ourém em 1917, se apercebessem que viviam um momento que ficou para a História.
Contudo, noutras ocasiões, é evidente que o acontecimento será histórico.
O ataque às Torres Gémeas no 11 de setembro, a adesão de Portugal à CEE, o 25 de abril, o confinamento devido à Covid-19 em 2020, o golo do Éder.
Todos os que viveram o momento, participantes ou não, sentiram que era único e ficaria nos registos. 2022 está repleto desses momentos: uma invasão em larga escala em território europeu; uma pico de inflação súbita que não se sentia há décadas; a morte da monarca com o segundo reinado mais longo da História.
Apesar de se saber que estes momentos de 2022 serão históricos, é ainda incerto qual a marca que deixarão.
Será que a morte de Isabel II marca o declínio definitivo da monarquia inglesa e o fim da Commonwealth?
Será que o período inflacionista que vivemos é o primeiro ato de uma crise económica profunda e prolongada que deixará gerações mais pobres?
Será que a invasão russa da Ucrânia vai assinalar o início da Terceira Guerra Mundial?
Descobriremos a seu tempo.
P.S.: Quero deixar um especial abraço ao professor Vitorino Guerra por ter reforçado o meu gosto pela História. Obrigado, professor.
Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990