Opinião

Miopia

3 dez 2015 00:00

Os líderes do mundo tratam as questões do aquecimento global como se fosse um problema entre pessoas: mas com a Natureza não se negoceia, suborna ou interpreta.

Está a decorrer em Paris a conferência da ONU sobre o Clima. O objetivo é promover um compromisso para atenuar as alterações do ambiente e limitar a 2ºC o aumento da temperatura média da Terra até 2100. Segundo diversos especialistas, um aumento superior levaria a mudanças dramáticas, como o aumento de fenómenos meteorológicos extremos, desertificação de grandes áreas, inundações das principais cidades costeiras no mundo e a migração forçada da maior parte da população mundial.

A ONU organiza cimeiras e conferências sobre as condições ambientais há mais de trinta anos, embora as mais marcantes tenham sido na década de 1990. A Cimeira do Rio, em 1992, onde se instituiu a Convenção Quadro da ONU sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC) que admite a existência do aquecimento global e a responsabilidade humana do fenómeno. Em 1997 surgiu o famoso Protocolo de Quioto, que vigorou até 2012, para limitar a emissão de gases com efeito de estufa que causam o aquecimento global.

O resultado destas cimeiras tem sido, para ser simpático, diminuto. As emissões não baixam, a temperatura da Terra não para de bater recordes. E se a UE parece entusiasta na diminuição das emissões de gases, os dois maiores poluidores do Mundo – China e EUA – não querem nem ouvir falar disso, bem como a esmagadora maioria dos países. Basta pensar na extensão do protocolo de Quioto (Doha, 2012) que foi reconhecida por 36 países: os 28 da UE (representa cerca de 15% das emissões mundiais), a que se juntam Austrália,Bielorrússia, Cazaquistão, Islândia, Liechtenstein, Noruega, Suíça e Ucrânia – mas Bielorrússia, Cazaquistão e Ucrânia admitem sair do acordo. Portanto, os acordos que vão sendo assinados apenas contribuem para causar danos no clima, entre as árvores abatidas para fazer papel e as toneladas de CO2 emitidas nas viagens de avião.

Mas, se é um problema reconhecido por todos, porque é que ninguém faz nada? Numa palavra: miopia. Os líderes do mundo tratam as questões do aquecimento global como se fosse um problema entre pessoas: mas com a Natureza não se negoceia, suborna ou interpreta. É preciso adaptação para sobreviver, o Ambiente não se comove com boas intenções e promessas vãs.

Depois, há outra faceta da miopia: embora os efeitos do aquecimento global comecem a ser óbvios, não são suficientes para roubar votos e outros problemas parecem mais prementes, como os refugiados, o terrorismo e as artimanhas contabilísticas dos défices. Afinal, quem estará cá em 2100 para ver o que aconteceu? Os políticos que nos lideram parecem dar demasiado valor à frase de Keynes “no longo prazo estamos todos mortos”. Esta frase, que muita gente dos negócios relembra com propriedade, chama a atenção para a necessidade de sobreviver como condição imprescindível para o sucesso futuro. E se este é um quadro mental aceitável nas empesas, não é na condução dos destinos de um país. Porque liderar um país não é gerir uma empresa ou administrar um orçamento familiar.

Os políticos preocupam-se com a espuma dos dias, com a manutenção do poder, sem pensar no legado que os seus filhos e netos herdarão. E isso significará que a prazo (não tão longo assim) vamos estar todos mortos: a Humanidade, toda.