Opinião

IA, a máquina já está a ganhar

16 abr 2023 10:22

Sinceramente (e ingenuamente) pensei que o raio da máquina ainda teria de comer muita sopa para começar a causar mossa

Desde a vertiginosa entrada em cena do ChatGPT, o debate em torno da Inteligência Artificial (IA) e do seu potencial para mudar o mundo, tornou-se incontornável. Passaram-se apenas quatro meses desde que a empresa OpenAI lançou a sua criação no mercado. Apenas quatro meses.

E, depois de quatro meses, 100 milhões de utilizadores mensais e uma presença mediática diária e constante, aconteceu aquilo que eu pensava que estaria ainda longe de acontecer. Sinceramente (e ingenuamente) pensei que o raio da máquina ainda teria de comer muita sopa para começar a causar mossa. Principalmente em áreas criativas, onde a repetição de padrões e de tarefas não é tão óbvia.

Não podia estar mais enganado e não tardou muito até conhecer as primeiras vítimas laborais da IA. E, quando digo “conhecer”, quero dizer literalmente conhecer. Há dias, a Domestika, plataforma de cursos online que sempre fez da criatividade o seu mote, justificou o anúncio do despedimento de 89 funcionários - quase metade dos actuais 198 - com o facto de querer substituir estas pessoas pelos serviços de IA da criadora do ChatGPT.

Assim, sem meias medidas, a empresa onde trabalhei até finais de Março de 2022 como editor de conteúdos e que, ao longo do último ano, logo após chegar ao estatuto de unicórnio, despediu quase 300 dos meus colegas em todo o mundo, anunciou que está a trocar pessoas por uma máquina.

Não anunciou que vai implementar IA para ajudar a melhorar a produtividade dos seus funcionários, ou para os apoiar na criação de melhores serviços para os seus clientes. Nada disso. Tradutores, copywriters, designers, criadores de conteúdos, entre outros, substituídos por uma máquina. Ponto.

Nunca tinha experimentado o Chat GPT mas, antes de escrever este texto, pedi-lhe: “escreve um artigo para o JL, como se fosses o Sérgio Felizardo, sobre os despedimentos na Domestika”. Apesar de o resultado ter sido bastante básico, dá para perceber que, se chegámos a isto em apenas quatro meses de abertura ao utilizador, os próximos anos não auguram nada de bom.

Resta-nos esperar que a máquina tenha em conta o que ela própria escreveu como se fosse eu a escrever para o JL sobre os despedimentos na Domestika: “É crucial que sejam tomadas medidas para garantir que o desenvolvimento e uso da IA sejam guiados por princípios éticos e responsáveis”.