Opinião
Diferentes pesos e medidas
De realçar o imaginário criado este ano, que colocou el rei D. João I a unir um País desavindo, depois da questão que opôs os partidários do mestre de Avis aos de D. Juan I, de Castela.
Esta semana, procurámos pontos de norte a sul do distrito onde é possível ainda encontrar locais paradisíacos de férias, sem confusão, sem filas de trânsito, sem encontrar os vizinhos e colegas de trabalho. Numa lista que, dadas as limitações de espaço teve de ser bastante reduzida, deixamos algumas sugestões das maravilhas que se podem encontrar por cá. Falamos das praias atlânticas, mas também das que se encontram nos meandros dos ribeiros, no meio das serras, da gastronomia, do património, das florestas originais e intocadas deste eucaliptal à beira-mar plantado.
Destaque igualmente para a entrevista a Susana Carvalho que publicamos nesta edição. A primatóloga de Leiria conta, entre outras coisas, que, na mesma semana em que foi convidada para ser professora adjunta na Universidade de Oxford, recebeu uma carta de uma conhecida universidade portuguesa informando-a de que o seu currículo não se adequava às características exigidas para dar aulas nesse estabelecimento de ensino nacional. Dá que pensar, não dá?
Mudando de assunto, o passado fim-de-semana foi de Mercado Medieval e recriação histórica no castelo e no centro de Leiria. A autarquia afirmou mesmo que a sua previsão de mais de 16 mil visitantes, em três dias, foi “facilmente atingida”.
De realçar o imaginário criado este ano, que colocou el rei D. João I a unir um País desavindo, depois da questão que opôs os partidários do mestre de Avis aos de D. Juan I, de Castela. De sublinhar o interesse que o evento suscitou no público, mesmo em fim-de- semana de calor e de praias convidativas.
O que não é de realçar num evento de recriação medieval, supostamente português e leiriense, é o facto de, ano após ano, continua a apresentar odaliscas a fazer danças do ventre, demonstrando que não houve grande preocupação com a verdade histórica, pelo menos neste capítulo.
Ir a uma “prateleira de supermercado” e trazer de lá um pacote “pseudo-medieval” para fazer o mesmo que todas as vilas e cidades com festinhas de cavaleiros a fingir, já não é suficiente para Leiria.
Pede-se, pelo menos, correcção histórica e adequação às personagens e comunidades reais que criaram e contribuíram para que existisse a cidade do Lis. É a nossa história e identidade que está em causa e não apenas uma actividade recriativa.
O que também não é de realçar é a confusão que se viveu durante as horas de maior afluência. Como é possível enfiar milhares de pessoas pela muralhas do castelo adentro e, daqui a um mês, anunciar a sete ventos que o Festival Gótico Entremuralhas, único no mundo, só pode ter 737 entradas diárias para preservar a velha fortaleza medieval?
O numerus clausus, que perfaz 2211 pessoas em três dias, até está referido no site da própria Câmara Municipal.
E nem vamos abordar os relatos de incidentes com cuspidores de fogo, gente espremida, má organização dos espaços e até de um pé partido, que maculam a afirmação de que foi tudo perfeito e um grande êxito.
Servem estas linhas apenas para lembrar, mais uma vez, que quantidade não é nem nunca foi sinónimo de qualidade. Não desvalorizando o trabalho árduo de quem colocou de pé este evento, é preciso pensar no que se está a fazer, se há condições de o fazer crescer e, acima de tudo, fazê-lo evoluir para uma proposta com qualidade e de acordo com as características únicas de Leiria. O público agradece.