Opinião

A solidão e a solitude

1 ago 2024 16:10

A solidão é um imenso fardo do qual dificilmente um ser humano se consegue livrar sozinho

Numa altura de férias de Verão para as quais se desejam e planeiam inúmeras partilhas e encontros, será estranho, para quase todos, pensar em solidão ou em vidas vividas com muitos momentos a sós. A solidão, quando continuada, é uma circunstância difícil, naturalmente experimentada com uma tristeza, uma mágoa e um desencanto que se acumulam com o passar do tempo, podendo acabar por se tornar num peso demasiado grande e desembocar numa tristeza funda, numa vontade de deixar de existir, ou naquele definhamento paulatino, inexorável, e silencioso que alguns seres humanos vão carregando durante quase toda uma vida.

A solidão pode ser o resultado de uma existência com alguma inépcia para os relacionamentos, ou de uma atitude de afastamento determinado por uma razão que um dia pareceu válida e se foi depois eternizando, ou como consequência de um “feitio” difícil e jamais domesticado; seja qual for a sua origem, a solidão vai cavando lentamente um fosso cada vez mais fundo, desesperado e desiludido, entre alguém e todos os outros que o ro-deiam.

A solidão é um imenso fardo do qual dificilmente um ser humano se consegue livrar sozinho, porque é algo que acontece por falta de quem, muito próximo, faça mesmo muita falta; seja por morte, por demasiada distância, ou por significante desatenção por parte de quem deveria estar atento, a ausência instalada traz a certeza de não se ser importante para ninguém. É o vazio.

Muito diferente é estar-se muitas vezes sozinho, por opção, ou porque uma circunstância limitada no tempo a isso obriga e se usa esse momento em proveito próprio, com tranquilidade e prazer. Chama-se solitude e é uma escolha, uma necessidade, ou uma forma de saber melhor viver. Pode ser uma prática natural, instintiva, fácil desde o primeiro momento em que se torna apelo, mas pode também ser uma lenta conquista de espaço e de tempo, e um investimento na capacidade de fazer entender aos outros uma certa forma de ser e de estar.

A solitude é um encontro com nós próprios, a maior parte das vezes um sossegadíssimo e prazeroso encontro, outras vezes um pouco menos sossegado, mas útil, quando nos avaliamos sem distrações e sem pressão, e podemos ver com clareza o que de outro modo não veríamos tão bem.

A solitude é um prazer na atenção com que se olha e vê, com que se pensa e reflecte, com que se descobre e constrói. É um lugar onde o mundo perde fronteiras de espaço e de tempo, onde os contornos da vida quotidiana se diluem, e onde nos sentimos ligados aos outros como se longos e finíssimos fios nos mantivessem equidistantes, sendo nós uma ilha, flutuando num mar que nos define melhor os contornos, tornando-nos mais conscientes da nossa própria existência, e do modo como existimos.

A solitude é o próprio prazer de existir. A solidão autoavalia-nos por baixo; a solitude dá-nos a medida certa.