Entrevista

Entrevista | D. António Marto: "A oposição ao Papa tem por detrás motivos políticos e económicos"

25 out 2018 00:00

“É escandaloso” que, em vez de dar atenção às vítimas de abuso, se tenha procurado salvaguardar a imagem da instituição.

Maria Anabela Silva

Depois do consistório, onde foi feito cardeal, acaba de ser escolhido pelo Papa para o Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida. Como vê mais esta escolha do Papa Francisco?

Era uma pergunta para pôr ao Papa (risos). Já a nomeação para cardeal foi surpresa para mim. Não sei os motivos pelos quais o Papa me escolheu para ser seu colaborador próximo nas questões do governo da Igreja. Não fiz a escolha para este dicastério nem fui ouvido sobre o meu gosto.

Mas é uma área que lhe interessa, nomeadamente as questões da família.

É uma área onde me sinto bastante à vontade. Porventura, o Papa sabia isso, pelas conversas que tive com ele sobre a questão da família, sobre a exortação apostólica sobre a alegria do amor e a propósito da situação dos fiéis que vivem em nova união. Talvez tenha sido por isso que me escolheu para este dicastério, que é uma espécie de ministério do governo da Igreja. Este é sobre a vida e a missão dos leigos e da família na Igreja e no mundo, sobre o cuidado pastoral dos jovens e a promoção e defesa da vida. É um campo muito vasto.

Já tem ideia de qual será a sua agenda neste dicastério?

Ainda não. Certamente serei chamado a Roma para me atribuírem tarefas específicas, porque é impossível abarcar todas as áreas. Isto realiza- -se em diálogo, com as Conferências Episcopais e com as igrejas locais, mas também através de congressos, de estudos específicos ou da realização de encontros internacionais, como as jornadas mundiais da juventude ou o encontro mundial das famílias.

Teve já a oportunidade de falar com o Papa Francisco sobre a nomeação para cardeal? Consegue perceber as razões da sua escolha?

Quando fui receber as insígnias de cardeal e cumprimentei o Papa, disse- -lhe: "Santo Padre, Nossa Senhora de Fátima e os Pastorinhos agradecem- -lhe o dom que quis fazer a Fátima". E ele, que tem sempre resposta pronta, perguntou-me se eu era o representante deles. Ri-me. Disse-me [que a nomeação para cardeal] era uma carícia de Nossa Senhora para comigo. Penso que a nomeação terá a ver com a projecção de Fátima, que foi o motivo pelo qual me encontrei com ele em audiências privadas. Além da preparação da viagem a Fátima, falávamos sobre a vida da Igreja. Porventura, terá visto em mim um bom parceiro, alguém que está em sintonia com ele neste processo de reforma da Igreja, que ele iniciou e que quer levar para a frente.

Houve quem considerasse a sua nomeação como "uma reprimenda" aos sectores mais conservadores da Igreja em Portugal.

Não acredito nisso. O Papa não segue esses critérios. Encontrou aqui um interlocutor e um apoiante para a reforma da Igreja e, porventura, quis reconhecer a projecção mundial que Fátima tem. Não mais do que isso.

Afirmou, durante a recente peregrinação internacional ao Santuário de Fátima, que as reformas na Igreja encontraram sempre oposição. Em que difere hoje essa oposição?

Os que hoje estão a fazer oposição ao Papa Francisco, são da mesma linha daqueles que nunca aceitaram o Concílio Vaticano II. O que tem de mais específico a oposição que hoje é feita prende-se, em primeiro lugar, com a globalização. Antigamente, as oposições eram restritas aos lugares onde ocorriam. Hoje, num instante, todo o mundo fica a par disso. Depois, é feita por um grupo ultraconservador que tem por detrás motivos políticos e económicos. O Papa é, neste momento, uma figura de referência mundial. Talvez a única referência mundial que é aceite por crentes e não crentes, que põe o dedo nas feridas do mundo moderno, concretamente nas desigualdades gritantes, num certo capitalismo selvagem, na questão do fenómeno migratório e da resposta solidária que a comunidade internacional lhe deve dar. Isso incomoda vários países, grupos e lobbies económicos, que se têm aproveitado da situação de oposição ao Papa desencadeada pelo antigo Núncio para uma campanha organizada, não apenas contra a Igreja, mas contra a pessoa deste Papa, chegando ao cúmulo de pedir a sua demissão.

Aquando da sua nomeação para cardeal, apontou alguns temas “apaixonantes”. Além das questões da família e dos jovens, referiu a “purificação da Igreja”. Em que sentido defende essa purificação?
A reforma que o Papa quer empreender e para a qual entende ter sido mandatado

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